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Redes sociais como ferramenta de protesto 4

Lideranças emergentes
"Não há como negar que as mídias sociais representam uma ferramenta importante para que os movimentos de protesto mobilizem efetivamente seus adeptos e transmitam suas mensagens. Como mencionado acima, a eficiência da ferramenta depende, no entanto, dos seus usuários, e o excesso de confiança pode se transformar em grave prejuízo.
Essas ferramentas podem afetar a evolução das lideranças. Para liderar um movimento de protesto eficazmente, os líderes de uma organização precisam se arriscar fora do ciberespaço e aprender o que significa enfrentar o poderio de contraespionagem de um regime em outros lugares, para além do mundo virtual. Ao realizar seminários e entrar em contato direto com as pessoas, os líderes de um movimento aprendem estratégias diferentes que funcionam melhor em estratos sociais diferentes, além de aprenderem a cativar públicos maiores. Essencialmente, os líderes de um movimento que exploram o uso de mídias sociais devem correr os mesmos riscos daqueles que não contam com esse tipo de mecanismo de rede. A conveniência e o anonimato parcial das mídias sociais podem levar um líder a perder a motivação de sair às ruas e fazer as coisas acontecerem.
Além disso, uma liderança pautada na realidade física é a que constrói e se fixa em um plano de ação estabelecido. O problema é que as mídias sociais, ao estarem disponíveis a um número maior de adeptos, subvertem a liderança de um movimento. Isso significa que um chamado à ação pode se alastrar como uma labareda em chamas antes de o movimento estar bem preparado, sendo capaz de pôr em risco a sua sobrevivência. Em vários aspectos, o Movimento Verde iraniano é um exemplo perfeito disso. O chamado à ação levou às ruas durante os protestos um grupo majoritariamente formado por estudantes que se autosselecionaram. O regime reprimiu as ações duramente, acreditando que o movimento não fosse suficientemente grande a ponto de lhe representar uma ameaça real.
Uma liderança muito dependente de mídias sociais pode isolar-se de movimentos políticos alternativos com os quais é capaz de compartilhar o mesmo objetivo de mudança de um regime. Esse é especialmente o caso quando outros movimentos não são "movimentos jovens" e, portanto, não tão aficionados por tecnologia. Isso pode criar sérios problemas uma vez que a revolução tenha sucesso e um governo interino precise ser criado. O movimento sérvio Otpor (Resistência) teve sucesso na revolução democrática sérvia de 2000 precisamente porque conseguiu unir uma oposição desigual formada por forças pró-Ocidente e nacionalistas. Mas, para facilitar o desenvolvimento desse tipo de coalizão, os líderes têm de se afastar de computadores e celulares e entrar em fábricas, plantações de arroz e outros lugares com grande número de pessoas, nos quais normalmente não gostariam de estar. Isso é algo difícil de fazer durante uma revolução, quando tudo está em curso e a insegurança pública é grande, especialmente em relação àqueles que afirmam estar liderando uma revolução.
Mesmo quando tem um plano claro, um líder aficionado por mídia pode não ter sucesso. Por exemplo, Thaksin Shinawatra, ex-primeiro-ministro da Tailândia e magnata das telecomunicações, usou seu poderio para realizar conferências de vídeo em estádios lotados e lançar duas ondas massivas de protesto envolvendo cerca de 100 mil apoiadores contra o governo tailandês em abril de 2009 e em abril e maio de 2010. Mesmo assim, ele não conseguiu tomar o poder e continua a ser uma voz desencarnada, capaz de balançar o barco, mas incapaz de assumir o seu leme.
O bloqueio à internet não diminuiu o número de manifestantes egípcios nas ruas. De fato, os protestos apenas cresceram conforme sites e a internet eram bloqueados. Se há condições propícias para uma revolução acontecer, as mídias sociais não parecem ser capazes de mudar isso. A simples presença de um grupo na internet não o torna mais popular ou ameaçador. Há grupos no Facebook, vídeos no YouTube e publicações no Twitter sobre os mais diversos assuntos, mas isso não os torna populares. Uma publicação de um usuário skinhead neonazista feita do porão da casa da mãe dele em Illinois não começará uma revolução _independentemente da quantidade de posts ou do conteúdo do que foi expresso. O clima deve ser propício para uma revolução, decorrente de problemas como inflação, deflação, escassez de alimentos, corrupção e opressão. E a população precisa estar disposta a se mobilizar. Por serem um novo meio de comunicação com vantagens e desvantagens, as mídias sociais não são capazes de criar movimentos de protesto. Elas somente permitem aos membros desses grupos comunicar-se mais facilmente.
Outras tecnologias, como o rádio de ondas curtas, que também podem ser usadas para a comunicação e a mobilização, estão disponíveis para manifestantes e revolucionários há muitos anos, assim como a internet, que é a base do desenvolvimento tecnológico, capaz de permitir que a comunicação ocorra de forma rápida e ampla. A popularidade das mídias sociais, um entre os vários benefícios da internet, pode ser usada pela mídia internacional como meio de observar acontecimentos a distância. Podemos assistir agora ao desenvolvimento de um protesto em tempo real, sem precisarmos esperar até que todas as notícias sejam organizadas e impressas no jornal do dia seguinte ou transmitidas durante os noticiários noturnos. A percepção ocidental costuma ser facilmente influenciada por manifestantes fluentes em inglês e aficionados por internet, que podem representar apenas uma pequena parcela da população de um país. Isso é ainda mais significativo em países autoritários em que a mídia ocidental não tem outra opção senão recorrer ao Twitter e ao YouTube para informar sobre uma conjuntura perigosa, aumentando assim a importância concedida às mídias sociais.
No Oriente Médio, onde a penetração da internet está abaixo de 35% (com exceção de Israel), se um movimento crescesse a ponto de causar mudanças, as adesões ocorreriam por boca a boca, não por redes sociais. Ainda assim, o aumento de conectividade da internet cria novos desafios para líderes de Estado, que têm provado ser mais do que capazes de controlar formas mais antigas de comunicação. Esse não é um desafio insuperável, como mostrou a China, mas, mesmo no caso da China, há uma inquietação cada vez maior sobre a capacidade dos usuários de internet de burlar mecanismos de controle e divulgar informações proibidas.
As mídias sociais representam apenas uma ferramenta entre muitas que um grupo de oposição pode usar. Movimentos de protesto são raramente bem-sucedidos se liderados do porão da casa de alguém por meio de uma arena virtual. Os líderes precisam ter carisma e vivência de rua, como líderes de qualquer organização. Um grupo revolucionário não pode depender de seus líderes mais aficionados em internet para promover uma revolução bem-sucedida mais do que uma empresa pode depender do seu departamento de informática para vender seus produtos. Isso faz parte da estratégia geral, mas não pode ser a única estratégia."

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