Pular para o conteúdo principal

Reforma política: O mal que o “distritão” pode fazer


Vale à pena ler o artigo de Léo Lince sobre o efeito que a proposta do PMDB do “distritão” pode gerar.
O “Distritão” será o fim dos partidos políticos e o colapso do modelo republicano
Léo Lince
A reforma política, tema recorrente nas últimas décadas, está de novo na pauta do parlamento brasileiro. E, a julgar pelos primeiros movimentos desencadeados a partir das mesas diretoras da Câmara e do Senado, corre sérios riscos de enveredar mais uma vez pelo perigoso caminho da galhofa.
Apesar do debate infindável e das proclamações generalizadas de apoio, não se consegue aprovar uma reforma política digna deste nome. Ao mesmo tempo, nunca se disputam duas eleições sob a mesma norma legal. Para contemplar o curto prazo dos interesses dominantes, os surtos de casuísmo também são recorrentes, o que só faz agravar a crise da representação.
A escalação dos indicados pelos partidos para a Comissão Especial da Reforma Política na Câmara dos Deputados, salvo as exceções de praxe, funcionou como sinal de alerta. Está lá, ostentando o galardão de condutores da mudança, a nata do intestino grosso da pequena política. Maluf, Newtão, Valdemar Costa Neto, Jose Guimarães, Eduardo Azeredo, entre outros, tendo a figura espantosa do herói da luta contra o "Fora Renan", Almeida Lima, como presidente da comissão.
No Senado, o mesmo diapasão. O presidente da casa, José Sarney, foi rápido no gatilho. Designou comissão e delimitou campo para o debate. Afinal, o patrimonialismo oligárquico, revitalizado nas abas do lulismo, tem muitos interesses a zelar. E seu líder maior, que já foi chamado no passado de "vanguarda do atraso", não dorme no ponto. Agora, reeleito com o apoio de 21 dos 22 partidos com representação na casa (viva o PSOL, gloriosa exceção), ele aspira definir os rumos da reforma.
A comissão do Sarney, ancorada na dobradinha Collor-Dornelles, é a plataforma de lançamento do chamado "Distritão" (*), uma aberração sem tamanho. Apresentado como panacéia universal, ele representa, na realidade, o agravamento de todas as distorções a nossa vida política. Uma espécie de apoteose do casuísmo.
Aprovado o "distritão", a própria idéia de partido político perde sentido. Idéias, valores, projetos, programas, coisas que articulam representantes eleitos, coletivos de filiados, o cidadão eleitor que se reconhece em tais propostas, as lealdades e compromissos capazes de fornecer sentido e previsibilidade ao processo político, tudo isso acaba. Será o supra-sumo da personalização na política. Os partidos, se sobreviverem, serão apenas cartórios para o registro de candidatos. Já não valem quase nada, valerão menos ainda.
A "fulanização" total da representação deve ampliar o quadro de fragmentação partidária. As tratativas da governabilidade, ao invés de dezenas, passarão, talvez, por centenas de partidos. Se não 513 partidos pelo menos meio milhar de prima-donas, proprietários privados dos votos dos brasileiros. O peso desigual dos votos entre cidadãos das diferentes regiões seguirá do mesmo tamanho, pois os distritos eleitorais, estados da Federação, tão desiguais em eleitorado e população, seguirão os mesmos
A proposta, que tem sido chamada com propriedade de "Emenda Tiririca", beneficia pessoas, fulanos, indivíduos já postos em situação privilegiada. Ou seja, as celebridades dos mais variados tipos, aqueles que já estão instalados nas alavancas do poder e, por último, quem tiver muito dinheiro. Aliás, sobre este último ponto, vale salientar a opinião do ex-ministro José Dirceu: "o "Distritão" é o puro poder econômico. Se elege quem tem mais dinheiro. Ponto Final". Declaração categórica de quem é do ramo, conhece do assunto. Afinal, no governo ele cuidou sempre de fornecer carne aos leões.
Gato escaldado, barbas de molho. Se o surto atual de debates vier a produzir uma nova farsa, ela será mais destrutiva do que as anteriores. A catástrofe que nos ameaça, o "Distritão", pode provocar uma aceleração vertiginosa da crise da representação política, com a falência total dos partidos e o colapso terminal do modelo republicano. No interior do parlamento e fora dele, nos movimentos e estruturas intermediárias que se ocupam com o debate sério do tema, está na hora de ligar o sinal de alerta: o "Distritão" é o fim da picada.
(*) Termo já usado para definir a proposta, defendida pelo vice-presidente da República Michel Temer, de eleger pura e simplesmente os mais votados, até o limite de vagas, extinguindo o atual critério do quociente eleitoral.
Léo Lince é sociólogo.

Comentários

Zé Gondim disse…
Fábio, não seria o caso de entrarmos JÁ, AGORA, na arena de luta (na porrada, mesmo...) e começarmos uma petição pública contra o Distritão? A nossa força como cidadãos tem dado bons resultados quando partimos pra porrada (caso da Lei da Ficha Limpa, por exemplo). O que achas?
Anônimo disse…
Excelente o artigo do Leo Lince. Merece ser lido e discutido. A propósito da reforma política fiz duas postagens sobre o assunto no blog do Vicente Cidade. O primeiro em fevereiro e outro hoje (9/3/11). Passe por lá. AFP

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de

Leilão de Belo Monte adiado

No Valor Econômico de hoje, Márcio Zimmermann, secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, informa que o leilão das obras de Belo Monte, inicialmente previsto para 21 de dezembro, será adiado para o começo de 2010. A razão seria a demora na licença prévia, conferida pelo Ibama. Belo monte vai gerar 11,2 mil megawatts (MW) e começa a funcionar, parcialmente, em 2014.

Ariano Suassuna e os computadores

“ Dizem que eu não gosto de computadores. Eu digo que eles é que não gostam de mim. Querem ver? Fui escrever meu nome completo: Ariano Vilar Suassuna. O computador tem uma espécie de sistema que rejeita as palavras quando acha que elas estão erradas e sugere o que, no entender dele, computador, seria o certo   Pois bem, quando escrevi Ariano, ele aceitou normalmente. Quando eu escrevi Vilar, ele rejeitou e sugeriu que fosse substituída por Vilão. E quando eu escrevi Suassuna, não sei se pela quantidade de “s”, o computador rejeitou e substituiu por “Assassino”. Então, vejam, não sou eu que não gosto de computadores, eles é que não gostam de mim. ”