Dia de Grand-Prix. Sol, depois de quatro dias de chuva. Semana cheia de atrações em Montreal. Ferraris por todos os lados. Aficcionados dispersos na multidão. Reconhecíveis por seus bonés, flâmulas e câmeras. Uma tribo, urbana dentre outras. Mas o dia pertence a eles. A Ferrari, como disse, onipresente; com suas máquinas. Leio nos jornais que dezenas dehabitantes de Nova York que possuem Ferraris vêm para Montreal, trazendo as suas máquinas, para fazerem a figuração da festa. O ponto de encontro é Crescent Street.
Crescent. Uma rua mítica de Montreal, com seus restaurantes, bares e boates. Alguns dos restaurantes de lá já estavam lotados há um mês. Reservas. Como não as temos, nos contentamos em caminhar na Crescent, em meio a uma multidão de entusiastas e de celebridades minúsculas. Mas nem tudo está perdido: a Moet & Chandon distribui champagne na rua. Legal não? Pois é. Legal.
Ah, sim, e as celebridades... Estrelas de variadas grandezas. Muitas mocinhas louras. E Ferraris para todos os lados. Mas já o disse, pois não? Bom, não tem muito mais a dizer.
Penso no que fascina as pessoas em torno. Velocidade, forma, tecnologia, arrojamento. Ideias contíguas. Barthes disse que os carros velozes são o equivalente contemporâneo das catedrais góticas. Não traduzem, eles, a vertigem da velocidade como aquelas traduziam a vertigem da altura?
E, em meio a tudo isso... sim, as Ferraris. Nada está mais presente e nada é mais incrível do que uma Ferrari. Nada, também, é mais visível do que uma Ferrari.
Meu irmão viria por aqui para o Grand-Prix, mas não veio. Se tivesse vindo, nós iríamos ao autódromo. Seria muito legal. Mas ele não veio e eu não me apressei para comprar meus ingressos. Resultado: acabou; e só em cambista agora, pelo quíntuplo do preço. Caro que nem pensar. Um mês antes já não havia mais ingressos. Aliás, para o Grand-Prix de Montreal de 1014, hoje, 35% dos ingressos já estão vendidos. Eu hein!
Mudança de ambiente. Saímos da efervescência branchée da Crescent e vamos para a efervescência intelô do Plateau, o bairro boêmio de Montreal. Lá, a F1 está menos presente. A principal artéria do bairro, a Avenue du Mont-Royal, está em festa neste fim de semana, data da de sua feira de rua. O trânsito está fechado e as duas centenas de lojas da rua botaram barraquinhas nas calçadas para vender produtos pela metade, pelo terço, pelo quarto do preço original.
De repente... ninguém sabe de onde... aparece na rua uma Ferrari. Ela tem a intensão de cruzar a avenida du Mont-Royal. Seu proprietário – imagino que o seja – tem um ar dissoluto. Ele sorri para o vento. Imagino que imagina o que se imagina da sua máquina.
Mas o que se segue ele não imagina. Tudo começa com uma velhinha, indignada. Ela está indignada com a invasão daquele carro no seu território. Para ela, visivelmente, uma Ferrari não é uma Ferrari. Ela levanta a bengala no ar, ameaçando o carro e o dono do carro de bengaladas se ele não sair já e já dalí. Segue-se um bate-boca e todo mundo ao redor toma partido da velhinha.
Imensa vaia. Centenas de pessoas vaiam a Ferrari e o dono da Ferrari. O dono da Ferrari está visivelmente humilhado. Não entende o que está acontecendo. A vaia continua, cresce no Plateau, cresce em Montreal, cresce do Quebec inteiro. Ecoa no universo. Desce o pano, rapidamente.
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