Pular para o conteúdo principal

A montanha mágica

"Porque a Literatura não era outra coisa senão isso: a associação de humanismo e da política, associação que se realizava tanto mais fàcilmente quanto o próprio Humanismo era política e a política significa humanismo. - Neste ponto, Hans Castorp escutava com muita atenção, esforçando-se por compreender tudo correctamente; porque esperava aprender finalmente em que consistia a crassa ignorância do cervejeiro Magnus e ficar sabendo por que a Literatura era outra coisa além de «belos caracteres». Settembrini perguntou se os primos já tinham ouvido, falar de Brunetto Latini, escrivão municipal de Florença, por volta de 1250, e autor de um livro sobre as virtudes e os vícios.. Esse mestre fora o primeiro a esmerilar a cultura dos florentinos e a ensinar-lhes a oratória, bem como a arte de dirigir a sua República conforme as regras da política. - Aí está, meus senhores! -exclamou Settembrini. - Aí está!-E passou a falar do «verbo», do culto do verbo, da eloquência, que qualificou de triunfo da Humanidade. Porque a palavra era a honra dos homens, e só ela tornava digna a vida do Homem. Não sòmente o humanismo, mas também a Humanidade em geral, toda dignidade humana, todo o respeito pelos homens e toda a estima do homem por si mesmo, tudo isso era inseparável, da palavra, estava ligado à Literatura . . .
- Estás a ver? - disse Hans Castorp mais tarde ao primo.
- Estás a ver que na literatura o que importa são as belas palavras? Eu percebi logo...
Também a política está ligada à ,literatura, ou melhor: origina-se na aliança, na fusão da humanidade e da literatura, pois a bela palavra gera a bela acção. - Faz dois séculos -disse, Settembrini - vivia no nosso país um velho poeta, um excelente conversador, que atribuía suma importância à beleza da grafia, porque, segundo a sua opinião, esta conduzia à beleza do estilo. Deveria ter ido um pouco mais longe e dizer que um belo estilo conduz a belas acções. - Escrever bem já quase é pensar bem, e daí a agir bem não há muita distância. Toda a Civilização e todo o aperfeiçoamento moral derivam do espírito da literatura, que é a alma da dignidade humana e que é idêntico ao espírito da política Sim, tudo isso era uno e indivisível, era uma e a mesma força e ideia, e podia ser resumido num único termo. qual era esse termo? Ora, compunha-se de sílabas familiares e cuja majestade os primos, sem dúvida, nunca haviam compreendido. 0 nome era: Civilização!"

Thomas Mann, "A Montanha Mágica".

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

Solicitei meu descredenciamento do Ppgcom

Tomei ontem, junto com a professora Alda Costa, uma decisão difícil, mas necessária: solicitar nosso descredenciamento do Programa de pós-graduação em comunicação da UFPA. Há coisas que não são negociáveis, em nome do bom senso, do respeito e da ética. Para usar a expressão de Kant, tenho meus "imperativos categóricos". Não negocio com o absurdo. Reproduzo abaixo, para quem quiser ler o documento em que exponho minhas razões: Utilizamo-nos deste para informar, ao colegiado do Ppgcom, que declinamos da nossa eleição para coordená-lo. Ato contínuo, solicitamos nosso imediato descredenciamento do programa.     Se aceitamos ocupar a coordenação do programa foi para criar uma alternativa ao autoritarismo do projeto que lá está. Oferecemos nosso nome para coordená-lo com o objetivo de reverter a situação de hostilidade em relação à Faculdade de Comunicação e para estabelecer patamares de cooperação, por meio de trabalhos integrados, em grupos e projetos de pesquisa, capazes de...

O enfeudamento da UFPA

O processo eleitoral da UFPA apenas começou mas já conseguimos perceber como alguns vícios da vida política brasileira adentraram na academia. Um deles é uma derivação curiosa do velho estamentismo que, em outros níveis da vida nacional, produziu também o coronelismo: uma espécie de territorialização da Academia. Dizendo de outra maneira, um enfeudamento dos espaços. Por exemplo: “A faculdade ‘tal’ fechou com A!” “O núcleo ‘tal’ fechou com B!” “Nós, aqui, devemos seguir o professor ‘tal’, que está à frente das negociações…” Negociações… Feitas em nome dos interesses locais e em contraprestação dos interesses totais de algum candidato à reitoria. Há muito se sabe que há feudos acadêmicos na universidade pública e que aqui e ali há figuras rebarbativas empoleiradas em tronos sem magestade, dando ordens e se prestando a rituais de beija-mão. De vez em quando uma dessas figuras é deposta e o escândalo se faz. Mas não é disso que estou falando: falo menos do feudo e mais do enf...