Pular para o conteúdo principal

Heranças à Esquerda 4

O Cristianismo revolucionário.

Entender o que chamei, no post anterior, de potencial revolucionário da Igreja significa entender a diferença entre as crenças presentes no mundo onde o cristianismo nasceu e cresceu e a mensagem inovadora trazida por ele. Entender essa diferença significa entender em que medida a doutrina cristã pregava uma revolução social.

As sociedade pré-cristãs, aí incluídas a intersubjetividade presente na Grécia, no Mediterrâneo, na Palestina, no Crescente Fértil, na Ásia Menor e no Egito, tinham algo em comum no que se refere a suas práticas religiosas: a percepção de que a alma não era algo inerente a todo ser, e sim algo em estado bruto ou fugidio, que poderia, no entanto, ser aperfeiçoado, construído, merecido. A esses homens era absolutamente chocante a idéia de que todos os homens teriam alma, de que todos os homens eramn iguais perante Deus, pregação básica e, por tudo isso revolucionária, que o cristianismo trouxe.

Perceba-se que quando digo revolucionário não estou dizendo inovador. A percepção cristã apenas renovava tradições bem antigas, presentes em todo esse espaço geográfico que referi. Como também, aliás, na própria Bíblia, onde salmistas vigorosos pregaram contra o orgulho dos ricos, a vaidade da veleidade e muito odiaram os poderosos e os que muito tinham.

A essência da mensagem cristão é esse comunismo bárbaro, pré-utópico, centrado num mítico e ao mesmo tempo místico nivelamento absoluto de tudo e de todos, gente, mundo, desejo. Um nivelamento de classes e uma uniformização das possibilidades, sempre renovada e garantida pela pregação quase selvagística do ódio aos ricos – que não serão admitidos na ceia do Senhor.

Alain de Benoist, em “Les idées à l’endroit”, 1979, diz que as sociedade antigas compreendiam o cristianismo como uma religião de escravos, ou como uma espécie de contra-cultura. Por isso ela atraia os despossuídos, os insatisfeitos, os renegados. Os primeiros cristãos eram os sem-família, os sem-terra, os profissionais mais injustiçados e dos setores menos elevados da escala de produção. Apisoadores, cardadores, artesãos, escravos. Gente rude e com pouca informação. Hostes de desvalidos, esquálidos, mendigos.

Eu próprio repudio o cristianismo como herança à esquerda. Creio que o mal que fez foi, sempre, muito maior que o bem, e penso que esse cristianismo antigo é apenas uma evidência, não um fato migrável aos nossos dias. No entanto, ele precisa ser conhecido e reconhecido em sua dimensão histórica, e isso vem a ser uma herança.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

Solicitei meu descredenciamento do Ppgcom

Tomei ontem, junto com a professora Alda Costa, uma decisão difícil, mas necessária: solicitar nosso descredenciamento do Programa de pós-graduação em comunicação da UFPA. Há coisas que não são negociáveis, em nome do bom senso, do respeito e da ética. Para usar a expressão de Kant, tenho meus "imperativos categóricos". Não negocio com o absurdo. Reproduzo abaixo, para quem quiser ler o documento em que exponho minhas razões: Utilizamo-nos deste para informar, ao colegiado do Ppgcom, que declinamos da nossa eleição para coordená-lo. Ato contínuo, solicitamos nosso imediato descredenciamento do programa.     Se aceitamos ocupar a coordenação do programa foi para criar uma alternativa ao autoritarismo do projeto que lá está. Oferecemos nosso nome para coordená-lo com o objetivo de reverter a situação de hostilidade em relação à Faculdade de Comunicação e para estabelecer patamares de cooperação, por meio de trabalhos integrados, em grupos e projetos de pesquisa, capazes de...

Artimanhas de uma cassação política: toda solidaridade a Cláudio Puty

Pensem na seguinte situação:  1 - Alguém, no telefone, pede dinheiro em troca da liberacão de licenças ambientais. 2 - Essa pessoa cita seu nome. 3 - A conversa é interceptada pela Polícia Federal, que investigava denúncias de tráfico de influência. 4 - No relatório da Polícia Federal, você nem chega a ser denunciado; é apenas um nome, dentre dezenas de outros, inclusive de vários parlamentares. 5 - Mesmo assim resolvem denunciar você por corrupção ativa. 6 - Seu sigilo telefônico é quebrado, sua vida é revirada. Nada é encontrado. Nada liga você àquela pessoa que estava pedindo dinheiro. 7 - Mesmo assim, você é considerado culpado. 8 - Os parlamentares, igualmente apenas citados, como você, são inocentados. Mas você, só você, pelo fato de ter seu nome citado por um corrupto, você é considerado culpado. É isso que acabou de acontecer com o deputado federal pelo PT do Pará Cláudio Puty. Ele vai entrar com um recurso junto ao Tribunal Sup...