A entrevista do Puty
A entrevista do chefe da Casa Civil do governo do Pará, Cláudio Puty, à jornalista Ana Célia Pinheiro, veiculada ontem no blog “A Perereca da Vizinha” mostra, principalmente, a distância ideológica entre uma representação elitista da política e uma representação que se pretende mais democrática. O problema não é a jornalista, mas o imaginário que ela reporta, com sua carga ideológica e, deve-se dizer, preconceituosa.
Essa carga está presente tanto numa elite, acostumada a ter na política (e no Estado) uma ferramenta para o benefício próprio, como em amplos setores da classe média, que não se beneficiam diretamente com essas ferramentas mas que, na ausência de todo espírito crítico, reproduzem o mesmo imaginário.
Um imaginário pobre de espírito e inculto, que se move com os signos do mesquinho, do ressentido e do rasteiro. Se decompormos a entrevista do Puty vamos ver que toda ela girou em torno de mitos: Como sempre, faltou o questionamento propositivo. Tudo girou em torno do boato, da tentativa de corroborar o imaginário constituído. Em vez de esclarecer, mais sombras. Como se o papel da imprensa fosse alimentar o disse-me-disse, requentar as sobras.
Podemos até fazer uma lista desses mitos, que as elites do Pará, muitas vezes com seus veículos de comunicação, mascam que nem goma e depois repassam para seus súditos continuarem a mascar (e assim passam a vida toda). Por exemplo, um mito sobre a DS e sua influência no governo, outro sobre o centrismo e o autoritarismo do secretário e outros ainda: expurgos, arrivismo petista, manipulação, ausência de obras, etc.
E estou usando a palavra mito não no sentido de “inverdade”, mas no seu sentido correto, que é o de mitificação, ou seja, ideologização de processos naturais do poder, esteja ele em sua forma política, econômica, cultural, etc.
Na verdade, a repetição, pela entrevistadora, de termos próprios ao derrisório stalinista (Rasputin eu nunca tinha ouvido; foi ótimo), pareciam enunciar um desejo de corroborar esse imaginário. Talvez, um fervor místico, ou talvez um frenesi... político. Mas outra vez repito: a voz que entrevistava Cláudio Puty não era a voz da jornalista: era uma voz coletiva, a voz que teme o poder das esquerdas, das massas, do esclarecimento, das políticas sociais, da justiça social. A oração que as direitas sempre rezam, às suas visagens, sempre mistificam a própria assombração.
Vou fazer o seguinte: vou falar aqui sobre cada um desses mitos, presentes na entrevista que Puty deu à Ana Célia, tentando esclarecer um pouco da irracionalidade que neles está presente. Vamos aos poucos, um ou dois desses mitos por dia.
Comentários
O mundo virtual ocupa esta lacuna que a imprensa tradicional deixa. Que bom que você aproveita este espaço e nos brinda com suas análises.
Nos interessa, no entanto, enquanto "homens críticos", creio eu, a separação clara destes dois componentes; o que só pode ser feito, a meu ver, a partir de uma análise fria e honesta destes discursos (como acredito ser sua intenção)!! O receio que tenho quando se trata de análise de ideologias, no entanto, é o de incorrer no erro de "mitificar" a "mitificação" que se apresenta enquanto crítica, encobrindo o que de "fogo" possa existir por detrás da fumaça ideológica conservadora que nos cerca!!?? Creio que a instrumentalização excessiva deste debate é algo que devemos combater também enquanto defensores ardorosos e irrestritos da ampliação dos espaços da "esfera pública" em nossa sociedade....
Aguardo com expectativa as próximas postagens sobre as "mitificações" "uma a uma".... Parabéns mais uma vez pela análise!!
Abs.
Danilo
Parabéns por mais este texto. O Cláudio Puty tem sorte de ter um amigo como você. E todos nós temos sorte de podermos ler o seu blog.
Márcia Leite
Dizer quais delas são justas e quais não o são gera um grande problema, porque atribuir o valor do justo, em se tratando do fato político, gera sempre uma contradição que desmente esse valor. Em outras palavras: não vá você, caro Danilo, me meter numa sinuca de bico... Atenhamo-nos ao fato e deixemos que os demais avaliem se justos ou não são esses mitos. Por parte das elites, não teremos nenhuma avaliação, porque elas não tem instrumentos para isso. Seremos xingado e enxovalhados, mas é só. Mergulharemos ou não no vazio e no silêncio deles. Nossa elite não tem pensadores, quando muito, são sujeitos setorizados em suas áreas. Antes havia, e dos grandes, como Octávio Mendonça, Orlando Bittar e outros, mas a geração deles morreu e não deixou herdeiros. Então, Danilo, façamos a nossa análise fria e honesta, como você propõe. Inclusive de nossa própria análise.
Concordo quando vc diz que, do lado do Puty, as mensagens foram passadas. E também acho que a habilidade dele vai ser colocada à prova, na verdade, nessa grande tarefa, que vai ser dialogar com a militância (e não, necessariamente, com o PT ou o governo) a respeito da aliança com o PMDB.
Por outro lado, também acho que mitificações e símbolos são inevitáveis e que eles sempre estarão presentes nos discursos midiáticos e em todos os outros. Inclusive nos discursos de esclarecimento, de ponderação, de racionalização e de objetivação. Qualquer coisa que eu mesmo venha a falar aqui, sobre isso, será, necessariamente, assombrado pelos fantasmas que a "esquerda" vê na direita. Porém, isso não nos impede de procurar um ponto de equilíbrio.