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Outra Amazônia 18: O habitus do projeto espoliador 1

Podemos dizer que o projeto predador, usurário e rentista, tal como acima caracterizamos a matriz tradicional de ocupação da Amazônia, corresponde à formação contemporânea do projeto de espoliação presente em todo movimento colonial. Revesti-lo com um fraseado novo, com aura de moderno, apenas obscurece seus velhos mecanismos de poder. 
Com efeito, é isso que está presente em tudo o que é explicado como sendo "neoliberal": na verdade, a atualização de velhas práticas colonizadoras. Devemos lembrar que os setores das elites locais que produzem esse fraseado e que assumem como suas as proposições neoliberais são setores da sociedade associados aos interesses, digamos assim, colonizadores.


Na verdade, desde seus primórdios, em 1616, a ocupação da Amazônia foi estruturada com base numa matriz predatória. As muitas riquezas, especiarias “ocidentais” – também chamadas “drogas do sertão” – madeiras e animais, dispersos num território vasto e de difícil acesso, motivavam um atitude e uma ideologia de usura, que se prolonga até nossos dias, na mentalidade das elites locais e das elites nacionais brasileiras.

O fracasso de todos os projetos progressistas locais, fossem eles populares, como na guerra civil de 1835-40, fossem movidos por setores mais democráticos das elites, como o republicanismo histórico “laurista”, entre 1890 e 1920, engendrou um recuo decisivo da Amazônia, um abandono de vários de seus próprios interesses e um correspondente avanço do capitalismo brasileiro sobre a região.
A partir dos anos 1950 as elites nacionais, em geral associadas às elites locais, tornaram a Amazônia uma espécie de fronteira aberta para a sua expansão, sempre seguindo o mesmo modelo predador e usurário. Contribuíram para intensificar esse processo a crescente pressão do mundo globalizado para que o Brasil estabelecesse as condições infra-estruturais necessárias para que os recursos da Amazônia ingressassem no ciclo produtivista ocidental.

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