O marxismo ocidental 11: Pierre Bourdieu 1
O elemento teórico central da obra de Bourdieu, se me permitem a objetividade, é a “prática”. Por prática, ele entende a vida real e imediata onde se dá o jogo do poder, e não a vida escolástica, conceitual e metafísica, sobre a qual se engendra o pensamento marxista. Vamos direto ao ponto: isso, precisamente, conforma uma herança à esquerda invulgar e ao mesmo tempo gloriosa.
O que Bourdieu nos ensina é que os indivíduos não produzem análises de contexto para, depois, definir suas ações. Eles simplesmente “jogam”. Nossas ações têm sua lógica mais frequentemente no senso prático do que no cálculo racional. Não temos uma consciência “plena” de nossas práticas, não agimos pelo cálculo.
Assim, noções como “espaço social”, “território” ou “poder”, são conformações que não estão presentes na prática, mas sim na percepção escolástica que nós, cientistas sociais, utilizamos para entender e explicar o mundo. Obviamente que essas explicações se racionalizam e se coisificam, passando a ser usadas não apenas por cientistas sociais, mas por toda a sociedade medianamente culta. Porém, sempre se volta para o mesmo ponto de partida: o que acaba valendo é a prática.
É no corpo a corpo que se produzem os efeitos de dominação. É a prática que distingue e exclui, conferindo aos agentes sociais as suas chances de mobilidade no jogo de poder. É ela que define a posição relativa que o sujeito ocupa em relação aos demais.
Para explicar melhor, Bourdieu nos sugere que a prática possui três elementos: o campo, o capital e o habitus. A prática se dá por meio da relação entre habitus e campo, através do capital.
Vamos por partes.
Campo, em síntese, é o contexto onde acontece a prática. Ele tende à reprodução – à reprodução do sistema social tal como ele é – mas também permite rupturas.
Há três formas de estar no campo: Participando da doxa, ou seja, da opinião comum, a opinião dos leigos; participando da ortodoxia, junto com os especialistas, os que falam em nome da doxa ou, enfim, participando da heterodoxia, com os especialistas que rompem com a doxa, questionando a raridade dos bens simbólicos.
A possibilidade de ruptura, ou de transformação do campo dependeria de uma relação entre a heterodoxia e os leigos.
Hum, acho que eu teria muito a falar sobre isso, mas aguardemos o tempo certo...
Passemos ao habitus. Habitus é a disposição mais ou menos permanente a ter um determinado comportamento ou atitude. Na prática, é a lógica do campo. É o próprio movimento de reprodução do campo. É o fundamento das práticas objetivamente classificáveis e,ao mesmo tempo, a própria classificação. Na sua cotidianidade, na sua pré-reflexividade, explica a "mágica" da reprodução social.
O habitus produz os “estilos de vida” e ao fazê-lo, estabelece um sistema de valores, códigos e sinais usados para distinguir os papéis sociais.
No próximo post falarei sobre a noção de capital, em Bourdieu, e sobre a maneira como o capital constitui a relação entre campo e habitus.
Toda terça-feira tem Heranças à Esquerda no Hupomnemata
Comentários
Gostei muito do seu post sobre a obra de Pierre Bourdieu.Estarei reproduzindo-o, em meu blog,MILITANCIAVIVA, devidamente creditado,inclusive os próximos intercorrentes, caso da sua parte não exista nenhum óbice.
Um grande abraço e saudações Ananins.