Reproduzo artigo de Gilka Resende, que acompanhou o debate sobre comunicação, durante o IV Fórum Social das Américas, que está acontecendo em Assunção até 15 de agosto.
DEMOCRATIZAR A COMUNICAÇÃO PARA INTEGRAR A AMÉRICA LATINA
Por Gilka Resende, 12.08.2010
Cerca de 100 comunicadores e representantes de movimentos sociais de diversos países das América Latina se reuniram no seminário “Um diálogo para democratizar a comunicação e impulsionar a integração” em Assunção, capital do Paraguai. O evento aconteceu nos dias 9 e 10 de agosto, prévios ao quarto Fórum Social das Américas ( 11 a 15/8).
Os povos originários foram lembrados durante a cerimônia de abertura por ser o Dia Internacional dos Povos Indígenas. Um documento enviado por indígenas da Colômbia ressaltou que “o direito ao acesso aos meios de comunicação de massa privados e públicos, e a apropriação de meios indígenas, não são garantidos pelos Estados nacionais colonizadores” .
A jornalista colombiana Vilma Almendra acredita que o diálogo entre movimentos sociais e governos é uma prioridade. Ela pertence à etnia indígena Nasa e é uma das organizadoras do Seminário. “A comunicação é muito importante para os povos indígenas, em espacial um comunicação que seja democrática e integradora. Queremos uma integração que permita articular políticas de transformação social, democratizar a comunicação e juntar lutas para que possamos resistir ao modelo econômico transnacional”, apontou Vilma.
A luta pela comunicação popular no Paraguai
O ministro paraguaio Augusto dos Santos esteve presente ao Seminário. Ele afirmou que “A reforma comunicativa é urgente e necessária nos países da America Latina”. À frente da Secretaria de Informação e Comunicação para o Desenvolvimento do Paraguai, disse que houve avanços na região em relação às políticas de comunicação e integração entre os países. No entanto, ressalta que os meios de comunicação dos governos devem estar nas mãos dos cidadãos para se tornarem realmente públicos.
Augusto enfatizou: “Os meios (de comunicação) públicos devem se fortalecer a partir das questões públicas e cidadãs. É certo que com isso veremos um pouco menos os rostos dos presidentes e ministros. Mas não por os meios de comunicação nas mãos dos cidadãos é um erro que não se deve cometer mais nessa América”.
Os movimentos sociais presentes ao Seminário afirmaram que a comunicação deve ser vista como direito humano, e não como mercadoria. Porém, assim como no Brasil, a situação das emissoras comunitárias no Paraguai não está fácil, segundo Altanácio Galeano, da Associação de Rádios Vozes do Paraguai. Ele faz parte da rádio Kasike FM, da cidade de Lambare, distante 30 quilômetros da capital Assunção.
“A nova lei de telecomunicações criminaliza quem quer exercer o direto à comunicação no país. Estávamos dialogando com o governo de Fernando Lugo, mas é como se todos os avanços tivessem se apagado. Em suas alianças, o governo deixou o setor de telecomunicações com a direita. Essa lei, por exemplo, prevê a prisão de pessoas e concede às comunitárias um alcance muito pequeno”, contou Altanácio.
Marco legal das comunicações da Argentina é referência
Nestor Buzo, presidente do Conselho Federal de Comunicação da Argentina, falou sobre o processo de aprovação da nova lei de meios que aponta a democratização da mídia do país durante o evento.
Ainda em meados dos anos 2000, movimentos sociais, sindicatos de trabalhadores de comunicação e acadêmicos de universidades formularam um estudo que elencou 21 pontos pelo direito à comunicação no país. Segundo Buzo, essa foi a base da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual na Argentina.
Como integrante da Associação Latinoamericana de Educação Radiofônica (ALER), Buzo participou deste processo que culminou na aprovação da nova regulação em outubro de 2009. Ficou claro para os presentes no seminário que o avanço das políticas de comunicação na Argentina somente foi possível com uma forte participação social.
Mais de 50 mil pessoas foram às ruas de Buenos Aires em apoio à aprovação do marco legal. Agora, os argentinos aguardam o decreto presidencial para a lei entrar em vigência. A nova lei substitui a instaurada na década de 80, ainda durante a ditadura militar no país.
Um dos principais pontos aponta que a comunicação na Argentina passa a ser feita por emissoras de rádio e televisão de três tipos: emissoras comerciais, públicas e por aquelas que não têm fins de lucro, em que inserem os meios comunitários. Cada um desses segmentos passa a ter 33% do espaço radioelétrico.
“Uma lei é sempre produto de uma correlação de forças na sociedade. Não é simplesmente a vontade de um governo. É a correlação de forças políticas somada a uma decisão política de um governo”, completou Nestor Buzo.
FSA foi central para avanços de uma comunicação que integre o continente
Na opinião de Oswaldo León, da Agência Latinoamericana de Informação (ALAI), o FSA foi central para os avanços políticos em temas que relacionam comunicação e integração na América Latina. A primeira edição do encontro aconteceu em 2004 na cidade de Quito, no Equador. León analisa que, depois de três edições, a América Latina vive hoje um momento de governos “abertos ao diálogo” com os movimentos sociais.
Em contrapartida, os meios de comunicação privados fazem o que León chama de “campanha publicitária em face oculta” contra os avanços da democratização da comunicação nos países latinoamericanos. “Coincidentemente a maioria dos centros de estudos e observatórios de comunicação recebem financiamento dos Estados Unidos”, ironizou.
Osvaldo León criticou a visão dominante sobre a regulação dos meios. Em suas palavras: “Essa é uma lógica estabelecida a partir dos poderosos. Para eles, em matéria de comunicação, a melhor lei é aquela que não existe. Então, qualquer mínima proposta de regulação se traduz como uma ameaça à liberdade de expressão”.
Os comunicadores e representantes de movimentos sociais formularam durante o seminário uma nota em solidariedade ao povo e ao governo da Venezuela. Esse seria um exemplo da Campanha apontada por Oswaldo. Sandra Trafila, comunicadora da Associação Nacional de Mulheres Rurais do Chile, leu o documento ao final do Seminário. “Esse pronunciamento é um ato de solidariedade ao povo venezuelano e ao processo bolivariano para defendê-lo frente aos constantes ataques dos meios de difusão de grupos monopólicos que vem demonizando o governo da Venezuela”, explicou.
Análises e reivindicações aos governos foram elaboradas em dois grupos de trabalho: “direito à comunicação e movimentos sociais” e “políticas de integração latinoamericana”. Sobre esse segundo ponto, os presentes ao Seminário ressaltaram a necessidade de romper com acordos de livre comércio e fortalecer acordos como a ALBA – Alternativa Bolivariana para os povos de nossa América.
A atividade foi realizada pela Agência Latinoamericana de Informação (ALAI), pela Associação Latinoamericana de Educação Radiofônica (ALER) e pela Minga Informativa de Movimentos Sociais, em parceria com o Governo Paraguaio.
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Luíza.