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O Conselho Estadual de Comunicação do Ceará

O Ceará saiu na frente e é o primeiro estado brasileiro a instalar o seu Conselho Estadual de Comunicação, uma das recomendações da I Conferência Nacional de Comunicação, acontecida no final de 2009. Essa iniciativa está gerando um imenso debate público por lá. Os grandes veículos de comunicação fazem campanha contra a instalação do Conselho, alegando que ele dificultaria o livre fluxo da comunicação democrática. Na verdade, o Conselho, dentre outras funções, tem a tarefa de garantir a real democracia, assinalando os excessos da mídia. Reproduzo, abaixo, a íntegra do projeto de lei que o cria.
PROJETO DE INDICAÇÃO 72.10 - Cria o Conselho Estadual de Comunicação Social do Estado do Ceará e dá outras providências.
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ decreta e eu promulgo nos termos da Constituição Estadual a seguinte Lei.
Art. 1º. O Conselho Estadual de Comunicação Social (Cecs), órgão colegiado integrante da Secretaria da Casa Civil do Estado do Ceará, com sede nesta capital e jurisdição em todo o território estadual, tem por finalidade formular e acompanhar a execução da política estadual de comunicação, exercendo funções consultivas, normativas, fiscalizadoras e deliberativas, respeitando os dispositivos do Capítulo V da Constituição Federal de 1988.
Art. 2º. Compete ao Conselho Estadual de Comunicação Social definir a política de comunicação do Estado do Ceará; realizar estudos, pareceres, recomendações, acompanhando o desempenho e a atuação dos meios de comunicação locais, particularmente aqueles de caráter público e estatal; e empreender outras ações, conforme solicitações que lhe forem encaminhadas por qualquer órgão dos três poderes do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário) ou por qualquer entidade da sociedade, sempre visando à efetivação do direito à comunicação, garantindo a liberdade de manifestação de pensamento, criação, expressão e de livre circulação da informação.
Art. 3º. São objetivos do Conselho Estadual de Comunicação Social:
I – garantir o exercício da mais ampla democracia em todas as suas ações e instâncias da sociedade, buscando sempre a unidade na ação;
II – orientar suas ações por princípios éticos e de igualdade, participação e representação da pluralidade da sociedade, priorizando o debate sobre temas referentes às liberdades de expressão individuais e coletivas, balizado na justiça social e na garantia dos direitos humanos;
III – defender o exercício do direito de livre expressão, de geração de informação e de produção cultural;
IV - formular e apresentar proposições que contribuam para uma melhor aplicação e cumprimento das normas constitucionais contidas no capítulo referente à comunicação social estadual;
V - propor medidas que visem o aperfeiçoamento de uma política estadual de comunicação social, com base nos princípios democráticos e na comunicação como direito humano, estimulando o acesso, a produção e a difusão da informação de interesse coletivo;
VI - participar da elaboração do Plano Estadual de Políticas Públicas de Comunicação Social, aprová-lo e acompanhar a sua execução;
VII - orientar e fiscalizar as atividades dos órgãos de radiodifusão sonora ou de imagem sob jurisdição do Estado, estimulando o fortalecimento da rede pública de comunicação de modo que ela tenha uma participação mais ativa na execução das políticas de comunicação do Estado do Ceará;
VIII - monitorar, receber denúncias e encaminhar parecer aos órgãos competentes sobre abusos e violações de direitos humanos nos veículos de comunicação no estado do Ceará;
IX – fomentar a produção e difusão de conteúdos de iniciativa estadual, observadas as diversidades artísticas, culturais, regionais e sociais do Ceará;
X – aprovar parâmetros normativos que estipulem a melhor distribuição das verbas publicitárias do Estado com base em critérios que garantam a diversidade e pluralidade, não enfatizando apenas a audiência e evitando a concentração de mercado;
XI – fomentar, por todas as suas instâncias e meios, a democratização da comunicação e da informação, estimulando a comunicação comunitária como instrumento potencializador e diversificador da comunicação social no Estado;
XII - promover o debate e o desenvolvimento de projetos e serviços de comunicação comunitária como espaço necessário para a reflexão sobre os assuntos de interesse geral e democratização da produção e acesso à informação, pautado pelas noções de participação da sociedade e de preservação do interesse público;
XIII – implementar políticas de capacitação dos cidadãos para leitura crítica dos meios de comunicação, nas suas diversas modalidades e para o debate da estética, dos conteúdos, da linguagem e das técnicas empregadas na produção das mensagens midiáticas;
XIV – acompanhar o cumprimento das normas relativas à propaganda comercial produzida e/ou veiculada localmente, referentes a tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos, terapias, exploração sexual, jogos de azar e outros, nos meios de comunicação locais;
XV – verificar o cumprimento das normas sobre diversões e espetáculos públicos em âmbito estadual;
XVI – observar e produzir, semestralmente, relatórios sobre a produção e programação das emissoras de rádio e televisão locais no que se refere ao cumprimento de suas finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
XVII – promover a produção independente e a regionalização da produção cultural, artística e jornalística nos meios de comunicação locais;
XVIII – estimular o processo de complementaridade dos sistemas de radiodifusão público, estatal e privado, em âmbito estadual;
XIX – sugerir legislação complementar quanto aos dispositivos constitucionais referentes à comunicação social local, principalmente no que diz respeito à utilização e distribuição dos recursos relativos às verbas publicitárias públicas e suas implicações políticas, estabelecendo critérios para repartição equitativa das dotações orçamentárias destinadas à publicidade oficial, fiscalizar o cumprimento do que prevê a Constituição Federal, em seu Artigo 37, § 1º, que veda o uso do erário para promoção pessoal de autoridades públicas;
XX – efetuar ações em defesa da dignidade da pessoa humana em relação a programas de emissoras de rádio e televisão que contrariem o disposto na Constituição Estadual, Constituição Federal, Declaração Universal dos Direitos Humanos, tratados internacionais e em outras legislações pertinentes à matéria;
XXI – exercer permanente vigilância quanto ao cumprimento da legislação e das normas que regulamentam a radiodifusão e as telecomunicações e sempre que necessário pedir esclarecimentos às Delegacias Regionais do Ministério das Comunicações (Minicom) e Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) sobre a situação das emissoras locais e os processos de outorga, renovação de concessão e autorização de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens, ao mesmo tempo formalizar denúncia junto a esses órgãos quando alguma emissora de rádio e/ou televisão desrespeitar a legislação pertinente;
XXII – encaminhar e acompanhar junto aos órgãos competentes, denúncias relativas a atitudes preconceituosas de gênero, sexo, raça, credo, classe social e outros, nos meios de comunicação locais.
XXIII – promover intercâmbio científico, cultural e político com outros Conselhos de Comunicação Social, nos âmbitos municipal, estadual e nacional;
XXIV – propor e estimular a celebração de convênios com organismos municipais, estaduais, nacionais e internacionais, públicos ou privados, objetivando a implementação de políticas, programas, objetivos e finalidades do Conselho, obedecendo aos dispositivos legais;
XXV – incentivar medidas de adoção de políticas de adaptação às novas contingências surgidas das inovações tecnológicas, inclusive sugerindo programas de universalização do acesso de qualquer pessoa ou instituição de interesse público aos serviços de telecomunicações, independente de sua localização e condição sócio-econômica, bem como as destinadas a permitir a utilização das telecomunicações em serviços essenciais de interesse público;
XXVI – propor e incentivar a implantação de acessos individuais para prestação de serviço de telecomunicações (inclusive internet) e TVs por assinatura (a cabo e satélite), em condições favoráveis a estabelecimentos públicos de ensino, bibliotecas, instituições de saúde, órgãos de segurança pública; e
XXVII – decidir sobre quaisquer medidas e/ou atividades que visem à execução de suas atribuições, objetivos e finalidades.
Art. 4º. O Conselho Estadual de Comunicação Social é constituído por 25 (vinte e cinco) membros titulares, com respectivos suplentes, a saber:
I) Sete do Poder Público
a) 1 (um) representante da Secretaria da Casa Civil, a ser indicado pelo (a) titular da pasta;
b) 1 (um) representante da Secretaria de Cultura, a ser indicado pelo (a) titular da pasta;
c) 1 (um) representante da Secretaria de Ciência e Tecnologia, a ser indicado pelo (a) titular da pasta;
d) 1 (um) representante da Secretaria da Justiça, a ser indicado pelo (a) titular da pasta;
e) 1 (um) representante da Assembléia Legislativa, a ser indicado pelo (a) presidente do Poder Legislativo Estadual;
f) 1 (um) representante da representante do Ministério Público Federal, a ser indicado pelo (a) procurador(a)-chefe no Estado do Ceará.
g) 1 (um) representante das escolas de comunicação (públicas e particulares), escolhido em eleição entre as faculdades de comunicação previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil.
II) Oito da Sociedade Civil – Produtores e Difusores
a) 1 (um) representante das empresas de radiodifusão sonora (rádio), escolhido (a) em eleição entre as empresas de rádio com sede no Ceará previamente cadastradas previamente junto à Secretaria da Casa Civil;
b) 1 (um) representante das empresas de radiodifusão audiovisual (TV), escolhido (a) em eleição entre as empresas de TV com sede no Ceará previamente junto à Secretaria da Casa Civil;
c) 1 (um) representante das empresas de mídia impressa (jornais e revistas), escolhido (a) em eleição entre as empresas de impresso com sede no Ceará previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
d) 1 (um) representante das empresas de telecomunicação, escolhido (a) em eleição entre as empresas de telecomunicação com sede no Ceará previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
e) 1 (um) representante dos veículos não-comerciais (jornais, rádios e TVs comunitários ou universitários), escolhido (a) em eleição entre os veículos não-comerciais com sede no Ceará previamente cadastrados previamente junto à Secretaria da Casa Civil;
f) 1 (um) representante das agências de publicidade, escolhido (a) em eleição entre as empresas de publicidade com sede no Ceará previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
g) 1 (um) representante das empresas de mídia exterior, escolhido (a) em eleição entre as empresas de midia externa previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
h) 1 (um) representante dos produtores de cinema e audiovisual, escolhido (a) em eleição entre as produtoras de audiovisual previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
III – Dez da Sociedade Civil - Trabalhadores e Consumidores
a) 1 (um) representante do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará, indicado (a) pela diretoria do Sindjorce;
b) 1 (um) representante do discentes dos cursos de Comunicação Social sediados no Ceará, escolhido (a) em eleição entre as entidades representativas dos estudantes previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
c) 1 (um) representante da sociedade civil organizada I, escolhido (a) em eleição entre as entidades com atuação na comunicação e na cultura ou em áreas afins previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
d) 1 (um) representante da sociedade civil organizada II, escolhido (a) em eleição entre as entidades com atuação na comunicação e na cultura ou em áreas afins previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
e) 1 (um) representante da sociedade civil organizada III, escolhido (a) em eleição entre as entidades com atuação na comunicação e na cultura ou em áreas afins previamente cadastradas junto à Secretaria da Casa Civil;
f) 1 (um) representante do movimento Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT), escolhido (a) em eleição pelo primeiro plenário do Conselho a partir de indicações;
g) 1 (uma) representante do movimento de mulheres, escolhida em eleição pelo primeiro plenário do Conselho a partir de indicações recebidas pela Secretaria da Casa Civil;
h) 1 (um) representante do movimento de pessoas com deficiência, escolhido (a) em eleição pelo primeiro plenário do Conselho a partir de indicações recebidas pela Secretaria da Casa Civil;
i) 1 (um) representante do movimento negro ou dos povos indígenas, escolhido (a) em eleição pelo primeiro plenário do Conselho a partir de indicações recebidas pela Secretaria da Casa Civil;
j) 1 (um) representante do movimento de jovens ou de crianças e adolescentes, escolhido (a) em eleição pelo primeiro plenário do Conselho a partir de indicações recebidas pela Secretaria da Casa Civil;
Art. 5º. A função de membro do Conselho Estadual de Comunicação Social do Ceará é considerada de interesse público relevante e não será remunerada.
Art. 6º.A escolha dos representantes da sociedade civil no Conselho será feita por meio de processo eleitoral, a ser realizado a cada três anos, contados a partir da primeira eleição, à exceção das indicações já previstas no Art. 4º.
§ 1º - Cada entidade com representação no Conselho indicará o nome de dois (duas) representantes, sendo um (a) titular e um (a) suplente;
§ 2º -Os membros do Conselho e seus (suas) respectivos (as) suplentes cumprirão mandato de 02 (dois) anos, não sendo permitida recondução;
§ 3º -Os representantes do movimento negro e do movimento de jovens efetuarão rodízio de titularidade, a cada mandato, com os representantes dos povos indígenas e do movimento de criança e adolescente, respectivamente.
§ 4º -Somente poderão participar do processo eleitoral, como eleitor ou candidato, representantes de entidades que tenham, no mínimo, um ano de comprovada existência, independentemente de registro legal (CNPJ).
Art. 7º.O processo eleitoral para a escolha das entidades que indicarão representantes em substituição aos atuais membros do Conselho, será realizado em até noventa dias, contados da publicação da publicação desta Lei, em conformidade com o regimento eleitoral a ser aprovado pelo plenário do Conselho Estadual de Comunicação Social, homologado pelo (a) titular da Secretaria da Casa Civil e publicado no Diário Oficial do Estado do Ceará em forma de resolução.
Parágrafo Único – Concluída a eleição referida no caput e designados os novos representantes do Cecs, caberá ao Secretário (a) da Casa Civil convocar e presidir a reunião em que tomarão posse os conselheiros e em que se realizará a eleição do Presidente do Conselho.
Art. 8º. A escolha da primeira formação do Conselho se dará por regimento formulado exclusivamente pela Secretaria da Casa Civil, publicado no Diário Oficial do Estado do Ceará em forma de resolução.
Art. 9º. O Conselho Estadual de Comunicação Social elaborará o seu regimento interno que deverá ser publicado no Diário Oficial do Estado do Ceará no prazo de 60 dias a partir da posse dos seus membros.
Art. 10º – As despesas com o funcionamento do Conselho Estadual de Comunicação são cobertas por orçamento próprio por ele proposto e cuja dotação consta do orçamento do Estado do Ceará.
Art. 11º. O Poder Executivo regulamentará esta Lei, no que couber.
Art. 12º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Sessões em 07 de julho de 2010.
Deputada Rachel Marques
Partido dos Trabalhadores – PT.
JUSTIFICATIVA
A proposta de criação do Conselho foi uma das 600 sugestões aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação realizada em dezembro de 2009 em Brasília.
Antes do encontro nacional, cada Estado promoveu sua conferência, além de encontros nos municípios. No Ceará, ocorreram conferências em Fortaleza, Quixadá, Juazeiro do Norte e Fortim; todas abertas ao público. O mérito desta proposição visa instituir um Órgão que possibilite ao Estado estar presente na defesa do interesse público no que tange ao desenvolvimento e à formulação de políticas estaduais voltadas para a valorização e fiscalização dos princípios constitucionais referentes à comunicação.
Ademais não podemos deixar de considerar que o Estado não pode estar omisso no debate em torno da democratização dos meios de comunicação e, neste sentido, o Conselho Estadual de Comunicação cumprirá um papel estratégico, principalmente no que tange à formulação de políticas voltadas para a cidadania mediante possíveis abusos e arbitrariedades dos meios de comunicação.
Segundo o mestre publicista e advogado Marcio Vieira Santos , "a liberdade de informação, a liberdade de expressão e mesmo a liberdade de imprensa são cânones constitucionais fundamentais, as quais mesmo figurando como cláusulas pétreas não são valores absolutos e, dentro do sistema constitucional normativo, e funcionalmente diante da indispensável garantia dos direitos fundamentais, devem existir harmonicamente com as demais liberdades", daí a "ratio legis" desta proposição, a saber: A possibilidade do exercício fiscal sobre a prática da comunicação.
Ademais a presente iniciativa encontra-se amparada na Emenda Constitucional n.º 65, de 16 de setembro de 2009, in verbis:
Art. 242. ...
§1° Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo, empresa e assessoria de comunicação social, observados os incisos IV, V, X, XIII e XIV, do art. 5º da Constituição Federal.
§2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica ou artística.
Pelo exposto, aguardo o apoio de meus pares na aprovação da presente proposição.
Deputada Rachel Marques - Partido dos Trabalhadores - PT

Comentários

Anônimo disse…
Poxa, adoro estudar história, especialmente a história da imprensa no Brasil. Por tudo o que já li, e ainda falta muito, constato que a imprensa sempre foi alvo de perseguições. Quando digo sempre é sempre mesmo. Desde a sua origem, pois Portugal impedia que a Colônia tivesse tipografias. Veio Dom João VI para o Brasil e inaugurou a Impremsa Oficial (Jornal Gazeta do Rio de Janeiro1808), censurando qualquer jornal que falasse mal do Rei (Nosso primeiro jornal teve que ser impresso em Londres, porque aqui não podia).
Ora, seu filho, D. Pedro I, ficou em seu lugar e também baixou o cassete em quem ousasse criticar o imperador. D. Pedro II foi mais flexível, porém aqui continou havendo censura. Já instaurada a República, o que vemos? mais censura! Veio Getúlio Vargas e mais proibições. Depois, aí nem se fale, os militares cometeram as maiores atrocidades contra os jornalistas até 1985. Caramba! Agora que estamos começando a sentir o gostinho de liberdade, corremos o risco de sofrer ainda mais! Eu não aceito! Digo isso de peito aberto, pois entendo perfeitamente que abusos são cometidos e sou terminantemente contra o desrespeito praticado por alguns veículos (os cadernos de polícia estão cheios desses exemplos) e os de política também. Sei também que empresários e políticos fazem uso de seus veículos para dizer o que bem entendem (o que precisamos é rever nossos conceitos, muitos deles já ultrapassados sobre o tão temido poder dos Mass Media, no tom dado pela Escola Funcionalista -
Robert Merton e Paul Lazarsfeld – EUA déc. de 40) . Mas tenho verdadeiro pavor de toda e qualquer restrição, pois é muito perigoso proibir abusos. Quem proibe? Quem decide que algo é abuso? Que veículo comete abuso? Que jornalista comete esses abusos? Olha, isso é muito delicado. Vamos ficar em alerta. Algumas coisas devem ser muito bem explicadinhas....

Ana Teresa Brasil - Jornalista
hupomnemata disse…
Olá Ana Teresa,
Você está certa. Os conselhos setoriais servem para ajudar a sociedade e se defender dos abusos dos governos e dos mercados. Como são conselhos formados por representantes da sociedade civil, escolhidos por eleição ou indicados por sua representatividade, os conselhos setoriais estão bem posicionados para proteger a sociedade de toda forma de abuso. No Brasil já temos Conselhos Nacionais e Estaduais (e alguns Municipais) de saúde, cultura, habitação, segurança, educação, etc. Por que não pode ter de comunicação? Quem está interessado em não permitir esse avanço? Alguns governos e, obviamente, os grandes grupos de comunicação. Obrigado pela visita.
Anônimo disse…
Fábio... sou contra os Conselhos e qualquer tipo de monitoramento à imprensa. Acho que não fui clara em meu comentário, com calma, poderei argumentar melhor. Obrigada pelo diálogo.

Ana Teresa
hupomnemata disse…
Ana Teresa, desculpe a mim, não ter compreendido bem sua posição. De qualquer forma, minha resposta pode ser reconduzida à condição de argumento... Em acréscimo, somente uma coisa: não vejo um Conselho de Comunicação como um "monitoramento". Penso que a sociedade precisa se defender de sua mídia, porque jornalista é uma coisa, empresa jornalística é outra. No aguardo de alguma oportunidade para ouvir suas idéias, agradeço também.
Anônimo disse…
Peguemos o exemplo da teoria Funcionalista. Aquela era a década de 40. Robert Merton e Paul Lazarsfeld estudavam os efeitos que os Mass Media provocavam na sociedade norte-americana(política, propaganda, informação). O rádio era o veículo mais acessado no momento. Teorias como aquelas surgiram de uma preocupação que cabia naquele contexto. Hoje, o chamado capitalismo informacional, como bem acentua Manuel Castells, nos apresenta outro contexto. Já podemos observar que as massas (o termo aqui é empregado de propósito) encontram mecanismos de resistência e ao decodificar as mensagens que lhes são "impostas" conseguem, sim, rejeitá-las ou transformá-las, e até mesmo produzir mensagens sobre outros assuntos. Movimentos sociais criam seus Blogs, colocam seus vídeo-documentários em praça pública ou na internet. Sabem identificar uma notícia tendenciosa. Ora, pois bem, se a sociedade não é tola, provando que hoje, cada vez menos, temos os "meios" como entidades soberanas e absolutas - então porque criar os ditos Conselhos? Quem teme a imprensa (especialmente a que tenta manipular fatos) contra "si", já deve começar a aceitar que não estamos mais nos anos 40 do século XX. Acredito que a "sociedade em rede", analisada com muita propriedade por Castells, continuará nos provando que, quanto mais os "abusos" forem cometidos mais serão repelidos. Repelidos de que forma? A possibilidade de termos este nosso diálogo pode ser um bom exemplo.
Querido, um prazer falar com você.

Ana Teresa
hupomnemata disse…
Mas não é exatamente isso que Castells coloca. Na verdade, ele desconstrói a tese, sempre funcionalista, da autonomia do campo do mídia, sugerindo que, na sociedade em rede, há uma interpenetração dos diversos campos sociais. É por essa razão que a sociedade consegue produzir auto-controles, e não por outra. Ou seja: para se defender da sua mídia, a sociedade lança mão da estrutura em rede, conformada por mecanismos diversos, inclusive midiáticos, mas não só. Por exemplo, conselhos. Conselhos são mecanismos não-midiáticos que ampliam as formas de conexão do campo midiático. E isso é apenas um exemplo - já que está, justamente, em pauta. Acreditar que a sociedade controla a mídia sem extrapolar o campo midiático é puro funcionalismo, e isso não é Castells. Se você observar, Ana, você está atualizando o discurso e as teses do funcionalismo norte-americano, centradas na idéia de que o controle do abuso se dá, funcionalmente, por meio da experiência do abuso. E não é bem assim. Há uma dimensão simbólica na violência da mídia que é subjetiva, intersubjetiva, e que demanda o debate público, que demanda posicionamento da sociedade. A cultura contemporânea desfaz as fronteiras entre os campos sociais e é por, para citar um exemplo, que o conselho nacional de psicologia tem feito recomendações, à sociedade brasileira, de que crie mecanismos de controle sobre a veiculação de publicidade destinada ao público infantil. Quem faz essas recomendações são especialistas, pessoas competentes para isso, e suas recomendações são acompanhadas por argumentos sólidos e estudos consequentes, e por isso merecem ser levadas em conta. Sem essa ajuda, preciosa, a sociedade brasileira teria menos instrumentos para avaliar a publicidade feita para crianças. Isso dá o limite da utilidade social dos conselhos públicos: eles não servem para controlar, mas para qualificar a sociedade: tanto o debate social como o debate político.
Anônimo disse…
Fábio. Adorei a sua resposta e lhe deixo aqui algumas considerações finais (conclusão de trabalho acadêmico que volta e meia faço --- risos).
Eu sonho com um país mais justo e feliz, isso porque já estou na casa dos 30, mas ainda quero mudar o mundo (espero que esse desejo não acabe nunca --- mais risos). Não tenho afinidades com os partidos tradicionais (herdeiros da colonização, República Velha, etc). Ao contrário, sou fã dos lutadores históricos dos partidos de esquerda. Tenho orgulho de ser governada por um presidente pertencente à classe operária. Acho isso lindo e sou testemunha dessa vitória, como cidadã e profissional, pois já era jornalista e trabalhava em redação quando Lula foi eleito pela primeira vez.
Voltando ao caso dos Conselhos. Meu grande questionamento (conhecendo um pouco da história da nossa imprensa) é: se criarmos esse tipo de instrumento - que pode ter sim, uma razão nobre, a de nos unirmos contra os mal-feitores da mídia e assim, defendermos a democracia brasileira - poderemos abrir um precedente para um controle da imprensa que pode não ser nada nobre. Temo que, dependendo do contexto em que nos encontremos no futuro, aqueles que detiverem o poder nas mãos decidam usar, de acordo com seus interesses e conveniências, os Conselhos de Comunicação.
Reforço que a imprensa sempre foi punida quando demonstrou ser contra governos. A imprensa nasceu assumindo causas políticas, este ou aquele interesse político-partidário. O nosso grande problema foi quando a imprensa tornou-se comercial capitalista e passou a usar o discurso da imparcialidade. Imparcial sabemos que ninguém é. O ideal seria que todos (como a globo, por ex.) deixassem claras as suas paixões políticas e que o público escolhesse, ou seja, cada um leria ou assistiria este ou aquele jornal com o qual tivesse mais afinidade (palavra de Fausto Neto). Mas enquanto isso não acontece, o bacana é ver o que já estamos presenciando: as redes sociais, as mobilizações pela internet, os Blgs, os vídeos no youtube, os documentários de Ongs sendo mostrados para populações de cidades pequenas. As resistências podem surgir de diferentes maneiras. Mas sou do tipo que prefere o lema: É proibido proibir! Eternamente defensora do jornalismo.
Ana Teresa.
Abraço pra você.
hupomnemata disse…
Ana Teresa,
Suas preocupações são legítimas e comprovadas pela história, mas a filosofia dos Conselhos é de que eles são empoderados pela sociedade civil, e não pelo Estado. Aliás, somente assim os conselhos podem funcionar como devem. Penso que o futuro do Brasil depende diretamente da capacidade de articulação da sociedade civil, bem como do seu fortalecimento. Ana, muito obrigado pela participação no blog.

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