Pular para o conteúdo principal

Diários mínimos 2 – Da sincronia de fatos aleatórios à sensação de pós-história


A semana que se abre com o incêndio do Museu Nacional – e, empiricamente, da destruição de todo esforço para construir uma identidade nacional brasileira –, se encerra, às véspera do Dia da Independência, com o candidato fascista, vestindo uma camisa verde-amarela e com os dizeres “Meu partido é o Brasil” sendo alvejado com uma faca.
São fatos independentes, aleatórios entre si, mas as narrativas que os envolvem sugerem alguma sincronia entre eles.
A narrativa produzida pela mídia, em nossa época, bem como a narrativa mais usual da descrição do quotidiano, na sociedade midiatizada, está baseada na exploração conjuntiva da aleatoriedade dos fatos. Ou seja: tanto a mídia como a sociedade midiatizada tornam sincrônicos eventos distintos entre si.
A narrativa da mídia se tornou hiper-realista e, por essa via, tudo parece dizer mais do que aparenta ser. Evidentemente porque há proveito a tirar da presunção de sincronicidade, da substituição do fato pelo vaticínio, da conveniência do caos. O fato é que vivemos uma época de significados saturados.
Desde que o museu Nacional pegou fogo venho explorando a sensação de estar vivendo numa pós-história. Numa história sem base material e plena de falsas sincronias, espaço no qual vicejam as fake news, a cobertura hiper-realista da mídia, o cinismo absoluto, conivente e conveniente dos tribunais e o fascismo galopante dos ditos “cidadãos de bem”.
Nesse mundo da pós-história tudo vai rapidamente se tornando passado: as coleções do Museu Nacional, a Petrobrás e o Pré-sal, as conquistas do trabalhismo e do sindicalismo, a pactuação democrática, o esforço de coerência…
Apenas Lula, curiosamente, apesar de tudo, não passa.  Apenas ele, o grande ausente, permanece presente, apesar das sincronias distópicas em que a grande mídia o envolve.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

Solicitei meu descredenciamento do Ppgcom

Tomei ontem, junto com a professora Alda Costa, uma decisão difícil, mas necessária: solicitar nosso descredenciamento do Programa de pós-graduação em comunicação da UFPA. Há coisas que não são negociáveis, em nome do bom senso, do respeito e da ética. Para usar a expressão de Kant, tenho meus "imperativos categóricos". Não negocio com o absurdo. Reproduzo abaixo, para quem quiser ler o documento em que exponho minhas razões: Utilizamo-nos deste para informar, ao colegiado do Ppgcom, que declinamos da nossa eleição para coordená-lo. Ato contínuo, solicitamos nosso imediato descredenciamento do programa.     Se aceitamos ocupar a coordenação do programa foi para criar uma alternativa ao autoritarismo do projeto que lá está. Oferecemos nosso nome para coordená-lo com o objetivo de reverter a situação de hostilidade em relação à Faculdade de Comunicação e para estabelecer patamares de cooperação, por meio de trabalhos integrados, em grupos e projetos de pesquisa, capazes de...

Artimanhas de uma cassação política: toda solidaridade a Cláudio Puty

Pensem na seguinte situação:  1 - Alguém, no telefone, pede dinheiro em troca da liberacão de licenças ambientais. 2 - Essa pessoa cita seu nome. 3 - A conversa é interceptada pela Polícia Federal, que investigava denúncias de tráfico de influência. 4 - No relatório da Polícia Federal, você nem chega a ser denunciado; é apenas um nome, dentre dezenas de outros, inclusive de vários parlamentares. 5 - Mesmo assim resolvem denunciar você por corrupção ativa. 6 - Seu sigilo telefônico é quebrado, sua vida é revirada. Nada é encontrado. Nada liga você àquela pessoa que estava pedindo dinheiro. 7 - Mesmo assim, você é considerado culpado. 8 - Os parlamentares, igualmente apenas citados, como você, são inocentados. Mas você, só você, pelo fato de ter seu nome citado por um corrupto, você é considerado culpado. É isso que acabou de acontecer com o deputado federal pelo PT do Pará Cláudio Puty. Ele vai entrar com um recurso junto ao Tribunal Sup...