Continuo lendo o livro do Heitor Lyra sobre a historia diplomática. Uma aluna curiosa das leituras que faço observou-o e disse que eu era um professor muito estranho, porque aquilo nada tinha a haver com o curso e nem comigo. Ora, é obvio que aquela moça nada sabe das minhas leituras, o que talvez equivalha a dizer de mim próprio. Mas trata-se de um comportamento habitual, freqüente, com o qual me deparo a todo momento. Percebo que os alunos constroem uma certa imagem dos seus professores que os vinculam de forma excessivamente objetiva ao conteúdo da disciplina ministrada. Assim, o professor que lhes explica a « cultura trivial » e a « pos-modernidade » - eu - acaba surgindo, no seu imaginário, como uma espécie de tecno-hit-pop-pos-tudo, ou seja, como uma cara meio maluco que sabe tudo sobre os movimentos culturais do mundo contemporâneo, mestre na ironia, agudo critico do classicismo. Em sintese, um « cult-cult », como ironiza a Marina esse lado meio tecno dos meus interesses e o padrão comportamental dos intelôs de Belém. Ora, não sou bem isso e talvez não seja nada disso : desconheço demais dos movimentos culturais contemporâneos, o pop e a pos-modernidade são para mim objeto de estudo, de prazer de estudo, mas não de prazer estético, sou péssimo na ironia (senão, talvez, na de mim mesmo), não sou critico de nenhum classicismo e muito menos um crítico agudo do classicismo. Enfim, não sou « cult-cult ». Aliás, bem ao contrário : meu prazer estético está na leitura dos livros não-modernos, muitos dos quais gosta-se hoje de chamr de clássicos. Tenho bem mais do que respeito, mas verdadeira reverência, por alguns autores que se encontram nessa categoria, como Cícero, Santo Agostinho, Eça, Machado de Assis – para citar alguns de nossa lingua. Ademais, faltam-se alguns dos outros sintomas do « cult-cult », segundo a Marina : espírito de festa, deslumbramento, uma turma, ler a Folha de São Paulo dos domingos, freqüentar obcessivamente as sessões de arte do Líbero, etc, freqüentar vernissages e certos bares que são outros (porém os mesmos, mas já não os conheço) de quando eu vivia aqui antes. Cults-cults são, por certos, muitos de meus alunos. Mas seu deslumbramento corresponde a uma etapa circunstancial de suas vidas, uma etapa que se desenvolve no cruzamento entre o fato de ser jovem, haver entrado para a universidade – e justamente para um curso de Comunicação -, conhecer pessoas novas e, por trás delas um mundo repleto de mídia, arte, produção, ficção, e, enfim, bem, ter professores como eu, que lhes fala sobre certas abstrações que, não obstante serem o fruto de um trabalho de investigação mais do que o fruto de uma experiência (ainda que estética), acabam parecendo, aos olhos dos alunos coisas muito « pós », muito « cult ».
Tomei ontem, junto com a professora Alda Costa, uma decisão difícil, mas necessária: solicitar nosso descredenciamento do Programa de pós-graduação em comunicação da UFPA. Há coisas que não são negociáveis, em nome do bom senso, do respeito e da ética. Para usar a expressão de Kant, tenho meus "imperativos categóricos". Não negocio com o absurdo. Reproduzo abaixo, para quem quiser ler o documento em que exponho minhas razões: Utilizamo-nos deste para informar, ao colegiado do Ppgcom, que declinamos da nossa eleição para coordená-lo. Ato contínuo, solicitamos nosso imediato descredenciamento do programa. Se aceitamos ocupar a coordenação do programa foi para criar uma alternativa ao autoritarismo do projeto que lá está. Oferecemos nosso nome para coordená-lo com o objetivo de reverter a situação de hostilidade em relação à Faculdade de Comunicação e para estabelecer patamares de cooperação, por meio de trabalhos integrados, em grupos e projetos de pesquisa, capazes de...
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