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Os 10 pecados da política cultural do PSDB - 1o pecado: o Elitismo

Estou viajando e o blog está no modo "releitura". O post a seguir foi publicado originalmente no dia 28/11/2006. Retorno no final de janeiro.



Primeiro Pecado: Elitismo

Elitismo é a crítica mais comum que, nos últimos doze anos, tem sido feita à política cultural do PSDB. Comumente, se compreende elitismo como uma cultura dita “de elite”, acusando-a de dialogar, quase exclusivamente, com produções culturais eruditas. Na verdade, porém, o verdadeiro elitismo é uma ação voltada para grupos privilegiados da sociedade e desenvolvida por meio de estratégias autoritárias. Ou seja, o elitismo não está, primordialmente, no objeto cultural, seja ele “erudito” ou não, mesmo porque os objetos culturais “eruditos” são legítimos e importantes para o desenvolvimento social. Ele está, na verdade, na forma fechada da política cultural, na sua intransigência em dialogar com agentes culturais que se distanciam dos padrões “eruditos”, na arrogância presente na sua visão de mundo e na sua tenacidade em privilegiar os agentes que identifica como seus pares no processo cultural.

A política cultural do PSDB foi direcionada a uma minoria branca, machista e logocêntrica. Aparentemente, valorizou-se uma certa percepção de “erudição” como uma estratégia de exclusão social. O gosto, é preciso lembrar, é também um agente da exclusão social. Evocar um pretenso “bom gosto” como norma equivale a marginalizar os agentes sociais que não fazem uso desse “bom gosto” na sua vida cotidiana.

A coisa, porém, fica realmente grave quando o pretexto do “bom gosto” produz um poder autoritário e quando esse poder autoritário, para legitimar-se, estabelece uma relação de clientelismo com agentes culturais que, não fazendo uso do “bom gosto”, acabam compondo com ele, valorizando-o. Para legitimar-se, a política cultural do PSDB estabeleceu uma importante rede de clientelismo.

Artista clientelista é uma conseqüência concreta da sociedade centrada na economia de mercado e, portanto, é um fenômeno perceptível até mesmo nos países mais desenvolvidos. Não é absolutamente o caso de fazer um julgamento moral dos artistas envolvidos por esse sistema, cabendo apenas observar que o clientelismo é uma condição perversa da cultura elitista e de mercado. Porém, é importante lembrar que o verdadeiro papel do artista não é afirmar o Estado. O papel social do artista só é eficaz quando ele embaralha as cartas do jogo. Ademais, há maneiras de apoiar a cultura – e de apoiar o artista – sem estabelecer com ele uma relação de débito, sem reduzi-lo à condição de um instrumento do poder público ou de sua ideologia.
Desse modo, pode-se dizer, a principal expressão do elitismo na política cultural do PSDB é a sua estratégia de cooptação do campo cultural, a instrumentalização do saber e do sensível pelo dinheiro, a compra disfarçada do gosto.

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