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Como fazer política em cinco minutos

Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, foi ao Congresso americano no último dia 23 de outbro para apresentar seu projeto de criptomoeda, o “Libra”. Praticamente nenhum deputado foi ouvi-lo. A sala vazia... Ou quase. Lá estava a deputada democrata por Nova York, Alexandria Ocasio-Cortez – estrela política e midiática ascendente da política norte-americana
(sugiro que vejam o documentário “Virando a mesa do poder”, a respeito dela e de outras campanhas de candidatas democratas nas últimas eleições norte-americanas, disponível na Netflix).
Só que Ocasio-Cortez não estava lá para saber da moeda digital de Zuckerberg.
Estava lá para aproveitar os 5 minutos que teria direito, como deputada, a questionar o visitante e crivá-lo de perguntas sobre seu envolvimento no caso da Cambridge Analytica.
Seguiram-se 5 minutos de arguição intensa, que deixaram Zuckerberg desnorteado. 5 minutos de política intensa, febril, de alta densidade.
“Para que possamos tomar decisões sobre o Libra”, começou a deputada, “penso que temos que avaliar o seu comportamento passado e o comportamento passado do Facebook. Então que queria lhe perguntar: quando ouviu falar, pela primeira vez, sobre as operações da Cambridge Analytica?”
Seguiu-se uma grueling examination, devastadora para o dono do Facebook. Ocasio-Cortez bombardeou-o de perguntas e Zuckerberg recuou, sem saber o que dizer, sem ter ponto de apoio de argumentação.
Como se sabe, a empresa Cambridge Analytica aparentemente teria utilizado dados cedidos pelo Facebook para influenciar nas eleições norte-americanas e em outras questões e disputas políticas.
Ocasio-Cortez fez a Zuckerberg as perguntas que jornalistas deviam fazer e não fazem.
"Could I pay to target predominantly black zip codes and advertise them the incorrect election date?" Ocasio-Cortez perguntou.
"No, you couldn't," Zuckerberg respondeeu.
"Could I run ads targeting Republicans in primaries saying that they voted for the Green New Deal?" Ocasio-Cortez, em seguida, perguntou.
"Congresswoman, I don't know the answer to that off the top of my head," Zuckerberg disse. "I think probably."
"Do you see a problem here with a complete lack of fact-checking on political advertisements?" Ocasio-Cortez contrapôs.
"Congresswoman, I think lying is bad," Zuckerberg murmurou, absolutamente perdido.
"So you will take down lies, or you won't take down lies? I think this is a pretty simple yes or no," elaperguntou, outra vez.
"It depends on the context that it shows up", disse Zuckerberg, nocauteado, completamente atônito.
Lição política: a intensidade da argumentação retemporaliza a política e reposiciona a narrativa diante da realidade.

Segue o vídeo:

https://www.youtube.com/watch?v=xT9BRUoXhh8


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