O marxismo soviétivo: A discussão Liberman
Evsei Liberman era um professor de economia da Universidade de Kharkov. Ele publicou um artigo no Pravda, no dia 9 de setembro de 1962, que chocou o mundo comunista. Defendia a idéia de que o lucro pode ser um elemento motor da economia. Propunha a reintrodução do lucro, e de outros mecanismos do mercado, na economia da URSS. Aliás, ia além: sugeria que o lucro poderia servir como um parâmetro para medir a eficiência das empresas. Esse artigo iniciou um debate que ficou conhecido como “a discussão Liberman” e está na raiz das tentativas de reforma econômica feita em 1965 e na posterior perestroika de Mikhail Gorbachev.
A base do planejamento econômico do estado soviético era uma espécie de ministério do planejamento, denominado Gosplan. Esse organismo elaborava os planos qüinqüenais e o decompunha em metas localizadas, rigidamente controladas, que eram repassadas às unidades produtivas, fossem elas fazendas ou fábricas. A tarefa-plano era cumprida no tempo previsto e, ao final deste, cada coletivo produtivo tinha a sua meta ampliada, no contexto de um novo plano, na lógica de uma produção sempre crescente. O problema era que, nessa lógica, a estratégia individual de cada unidade de produção não era, jamais, a de superar sua meta, mas a de, ao contrário, ficar aquém dela, para que a próxima meta fosse sempre menos ambiciosa e, portanto, mais facilmente atingida.
A proposta de Liberman era compensar as empresas por sua produtividade, ativando o interesse material individual, e mesmo coletivo, de seus funcionários. Porém, o que era realmente revolucionário na sua proposta era o que resultava, tecnicamente, dessa operação: a introdução do cálculo econômico como critério do planejamento. Se o lucro de uma empresa passasse a ser medido e comparado com o de outras se estaria introduzindo um critério baseado na racionalidade, um índice de base único, onde antes havia muitos índices diferentes, comparados de forma mais ou menos intuitiva.
Liberman ia além, e discutia o critério de atribuição dos preços e as relações das empresas com o plano. A extensão de suas proposições não teriam, provavelmente, o poder de abalar a estrutura do comunismo, mas de reforçá-la, revitalizá-la, e isso foi compreendido por muitos, motivando reformas reais, embora não muito grandes, no sistema soviético. Porém, foram combatidas pela burocracia partidária, como se sabe controladora do aparelho do estado.
O período Brejnev (1964-1983) foi uma espécie de consagração do sistema burocrático, com o agravo da escassez de recursos e o esgotamento do sistema de planejamento extensivo. Um colega de Liberman, Kossiguin, também ele professor de economia na Universidade de Kharkov, ainda tentou ativar uma reforma parcial da estrutura econômica do país, mas foi igualmente impedido pelos conservadores, e a próxima chance veio apenas nos anos 1980, com Gorbachev.
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