Pular para o conteúdo principal

Por novos rumos para a política de fomento cultural

Reproduzo artigo do deputado Cláudio Puty discutindo as políticas de fomento à cultura e convocando para a audiência pública sobre o assunto, que será realizada na Assembléia Legislativa do Pará, no dia 31 de outubro próximo.

Por novos rumos para a política de fomento cultural
publicado em O Liberal em 09/10/11

Cláudio Puty (*)

Poucas pessoas no Brasil negariam o papel central que a cultura, em sua diversidade e pluralidade, exerce na constituição de um país democrático, justo e soberano. Ao observarmos as mudanças da política cultural nas últimas décadas, com a constituição de órgãos específicos de gestão da cultura; a consolidação de instâncias de controle social e o estabelecimento da noção de que esta política pública deve prezar pela descentralização dos recursos e ruptura com o elitismo, não podemos negar que avançamos. 
Entretanto, há ainda muito a fazer. Somos um país que reflete no acesso a bens culturais suas múltiplas desigualdades. Segundo dados do Ministério da Cultura, 96% de nossa população não freqüenta museus; 93% nunca foi a uma exposição de arte; 78% nunca assistiu a um espetáculo de dança e 90% dos municípios do País não possuem cinemas, teatros, museus ou centros culturais. 
Nossa política de fomento à cultura é amplamente baseada nos incentivos fiscais – particularmente abatimento de algum imposto (imposto de renda, ICMS, ISS) até o limite estabelecido na legislação, em troca de apoio das empresas aos projetos previamente selecionados pelo governo. Hoje, no Brasil, de cada dez reais captados, nove são de recursos públicos de incentivo fiscal. 
Este modelo de financiamento da produção e fruição cultural foi inaugurado pela lei 8.313 de 1991, a chamada Lei Rouanet. Nesses seus vinte anos de vigência, a lei conseguiu atrair mais recursos para a cultura, mas acabou reproduzindo velhos problemas. Ao definir que o fomento a projetos culturais se daria com base na capacidade de captação junto a empresas, o modelo inaugurado pela lei Rouanet transferiu a decisão da partilha de recursos na área cultural da esfera pública para a esfera privada. Como conseqüência, mais concentração de recursos: 3% dos proponentes beneficiados captam cerca de 50% dos recursos; sendo que a região norte capta menos de 1% enquanto que a região sudeste capta 80% dos recursos, particularmente os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. 
Uma alternativa, sinalizada nos debates sobre a nova legislação de fomento cultural, o projeto de lei 6722 de 2010, que institui o Programa Nacional de Fomento à Cultura (oProcultura), seria vincular parte dos recursos advindos da captação via Lei Rouanet ao Fundo Nacional de Cultura, que passaria a obrigatoriamente destinar recursos às regiões brasileiras com base na sua participação na população nacional. Com base nesse critério, os recursos para a região norte cresceriam substancialmente. 
Outro problema que atinge a população das regiões mais distantes dos grandes centros, e particularmente seus produtores culturais, é o custo diferenciado de circulação e produção intra e interregional em nosso país. É muito mais caro produzir e difundir bens culturais na Amazônia e nada mais justo do que incorporar esse diferencial nos diversos editais nacionais, como, aliás, já é feito em outras políticas públicas, como na saúde e na habitação.  
Com base nessa preocupação, os delegados do Pará na última conferência nacional de cultura conseguiram aprovar nas suas resoluções o reconhecimento do Custo Amazônia e a conseqüente necessidade de que as políticas públicas sejam devidamente adequadas para lidar com este problema. 
Estas questões serão debatidas em Belém, no dia 31 de outubro, a partir das 15 horas, na Assembléia legislativa, em audiência promovida pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados com a presença do relator do Procultura, Deputado Pedro Eugênio (PT-PE). Será uma ótima oportunidade para propormos alternativas para uma política de fomento à cultura que reconheça na nossa diversidade regional uma das grandes virtudes de nosso vibrante país. 
(*) Deputado federal (PT-PA), presidente da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

O enfeudamento da UFPA

O processo eleitoral da UFPA apenas começou mas já conseguimos perceber como alguns vícios da vida política brasileira adentraram na academia. Um deles é uma derivação curiosa do velho estamentismo que, em outros níveis da vida nacional, produziu também o coronelismo: uma espécie de territorialização da Academia. Dizendo de outra maneira, um enfeudamento dos espaços. Por exemplo: “A faculdade ‘tal’ fechou com A!” “O núcleo ‘tal’ fechou com B!” “Nós, aqui, devemos seguir o professor ‘tal’, que está à frente das negociações…” Negociações… Feitas em nome dos interesses locais e em contraprestação dos interesses totais de algum candidato à reitoria. Há muito se sabe que há feudos acadêmicos na universidade pública e que aqui e ali há figuras rebarbativas empoleiradas em tronos sem magestade, dando ordens e se prestando a rituais de beija-mão. De vez em quando uma dessas figuras é deposta e o escândalo se faz. Mas não é disso que estou falando: falo menos do feudo e mais do enf...

UFPA: A estranha convocação do Conselho Universitário em dia de paralização

A Reitoria da UFPA marcou para hoje, dia de paralização nacional de servidores da educação superior, uma reunião do Consun – o Conselho Universitário, seu orgão decisório mais imporante – para discutir a questão fundamental do processo sucessório na Reitoria da instituição. Desde cedo os portões estavam fechados e só se podia entrar no campus a pé. Todas as aulas haviam sido suspensas. Além disso, passamos três dias sem água no campus do Guamá, com banheiros impestados e sem alimentação no restaurante universitário. Considerando a grave situação de violência experimentada (ainda maior, evidentemente, quando a universidade está vazia), expressão, dentre outros fatos, por três dias de arrastões consecutivos no terminal de ônibus do campus – ontem a noite com disparos de arma de fogo – e, ainda, numa situação caótica de higiene, desde que o contrato com a empresa privada que fazia a limpeza da instituição foi revisto, essa conjuntura portões fechados / falta de água / segurança , por s...