Pular para o conteúdo principal

Para entender melhor as eleições do Egito

A Irmandade Muçulmana, grupo religioso criado em Ismaília, no Egito, em 1927 é uma das protagonistas da eleição em curso no Egito, que decidirá qual papel o Islã terá na vida futura da república. O candidato Abdel Moneim Aboul Fotouh representa, pela primeira vez, uma chance razoável de um ex-membro de alto escalão da Irmandade ocupar um dos cargos mais poderosos do mundo árabe. Para alguns, seria a culminância da revolução, mas, para céticos mais seculares, marcaria seu fim. O artigo seguinte ajuda a compreender o que é a Irmandade Mulçulmana:

A reportagem é de Alexander Smoltczyk, da revista Der Spiegel e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 24-05-2012.
Tudo começou em Ismaília à margem do Canal de Suez quando Hassan al-Banna decidiu levar o Egito da idade moderna de volta a suas raízes. Ele foi o fundador do movimento. "Por que Ismaília?", pergunta Midhat Saki, uma autoridade menor da Irmandade Muçulmana na cidade. "Porque os colonialistas andaram por aqui como se o país lhes pertencesse. Eles permitiram que milhares perecessem durante a construção do canal", disse. "Eles beberam vinho, construíram igrejas e trouxeram missionários ao país. O xeque Banna começou a resistência aos missionários."
A Irmandade tem sua sede principal perto de uma loja de autopeças. As cadeiras ainda estão cobertas por capas de plástico e o símbolo da Irmandade, duas espadas cruzadas sobre o Alcorão, e as palavras "Preparai-vos", pende da escada. 
Com Banna no comando, a Irmandade cresceu e contava mais de meio milhão de membros quando ele foi morto em 1949. Saki relata como a Irmandade construiu mesquitas, hospitais e fábricas e como tentou espalhar o "Islã verdadeiro", de baixo para cima, usando a si mesma como modelo, e não de cima para baixo como os revolucionários fariam posteriormente no Irã.
Durante décadas, a Irmandade Muçulmana foi brutalmente reprimida pelos regimes egípcios comandados por Gamal Abdel Nasser, Anwar Sadat e Hosni Mubarak. Saki diz que ele mesmo foi espancado quando esteve na prisão. De lá para cá, a Irmandade virou uma força motriz na região. Ela influencia a política de Rabat a Damasco, e sua força crescente é temida tanto em Dubai quanto na Arábia Saudita e nos subúrbios de Londres e Paris.
A Irmandade tem hoje cerca de 600 mil membros no Egito. Seu braço político, o Partido da Justiça e Liberdade (PJL), ficou sendo o partido mais forte no Parlamento egípcio no fim do ano passado e começo do atual. A Irmandade tem uma estrutura hierárquica rígida, que permanece inalterada desde os tempos de Banna. Seu líder supremo é o presidente de sua direção executiva. Os membros são organizados em células chamadas "famílias". Cada família consiste de quatro irmãos. 
"É claro que queremos o califado", diz Saki. "Todos os países islâmicos precisam se tornar uma nação, mas sem violência". A sharia, diz ele, só pode ser introduzida no longo prazo, e, certamente, não por decreto. "Precisamos servir de modelo para que outros nos sigam." Em seguida, Saki diz alguma coisa que aponta diretamente para o cerne do movimento: "Queremos mudar as pessoas. Sem violência! Primeiro o indivíduo, depois a família e depois o mundo." Ele está se referindo a um programa educacional que culmine com um ser humano melhor, que a Irmandade chama de "renascimento". Isso explica por que o partido quer ocupar postos-chave em educação e cultura. Para a Irmandade, isso é mais importante no longo prazo do que conseguir o controle da polícia ou do Judiciário.

Fonte: IHU Online

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

O enfeudamento da UFPA

O processo eleitoral da UFPA apenas começou mas já conseguimos perceber como alguns vícios da vida política brasileira adentraram na academia. Um deles é uma derivação curiosa do velho estamentismo que, em outros níveis da vida nacional, produziu também o coronelismo: uma espécie de territorialização da Academia. Dizendo de outra maneira, um enfeudamento dos espaços. Por exemplo: “A faculdade ‘tal’ fechou com A!” “O núcleo ‘tal’ fechou com B!” “Nós, aqui, devemos seguir o professor ‘tal’, que está à frente das negociações…” Negociações… Feitas em nome dos interesses locais e em contraprestação dos interesses totais de algum candidato à reitoria. Há muito se sabe que há feudos acadêmicos na universidade pública e que aqui e ali há figuras rebarbativas empoleiradas em tronos sem magestade, dando ordens e se prestando a rituais de beija-mão. De vez em quando uma dessas figuras é deposta e o escândalo se faz. Mas não é disso que estou falando: falo menos do feudo e mais do enf...

UFPA: A estranha convocação do Conselho Universitário em dia de paralização

A Reitoria da UFPA marcou para hoje, dia de paralização nacional de servidores da educação superior, uma reunião do Consun – o Conselho Universitário, seu orgão decisório mais imporante – para discutir a questão fundamental do processo sucessório na Reitoria da instituição. Desde cedo os portões estavam fechados e só se podia entrar no campus a pé. Todas as aulas haviam sido suspensas. Além disso, passamos três dias sem água no campus do Guamá, com banheiros impestados e sem alimentação no restaurante universitário. Considerando a grave situação de violência experimentada (ainda maior, evidentemente, quando a universidade está vazia), expressão, dentre outros fatos, por três dias de arrastões consecutivos no terminal de ônibus do campus – ontem a noite com disparos de arma de fogo – e, ainda, numa situação caótica de higiene, desde que o contrato com a empresa privada que fazia a limpeza da instituição foi revisto, essa conjuntura portões fechados / falta de água / segurança , por s...