“As vezes, resistir significa
ficar. E as vezes significa partir. Por fidelidade a si mesmo”. Foi com esse
tweet que Christiane Taubira, ministra da justiça da França, anunciou que saia
do governo, que deixava o gabinete do primeiro-ministro Manuel Vals e, portanto, o
governo Hollande.
Taubira era a fiadora do governo
Hollande. A caução socialista de um governo que prometeu ser socialista e não
saiu do centro. Somente por causa dela, moralmente falando, o governo Hollande
continuava sendo de esquerda.
Sou seu fã. Mais um, porque há
muitos. Acompanhei seu ministério com curiosidade e até mesmo com encantamento. É raro
fazer política como ela faz: com extrema sinceridade e simplicidade. E evidentemente com fidelidade, tal como ela coloca no tweet.
Nascida na Guiana Francesa, aqui
ao lado, foi eleita para a Assembleia Nacional francesa, pelo Partido
Socialista em 1993 e, em seguida, deputada ao Parlamento Europeu. Sem que a
pauta estivesse combinada com ninguém, iniciou uma campanha para fazer a Europa
reconhecer a escravidão, que perpetrou durante séculos, como crime contra a
Humanidade. A proposta estava destinada ao fracasso, em meio a um parlamento
conservador e à acusação de proselitismo politico feita pela grande mídia, mas a
opinião pública de todo o continente se mobilizou a seu favor – sobretudo nos
países que mais escravizaram, inclusive Portugal - e o resultado foi histórico:
sua moção acabou sendo aprovada, levando a uma enxurrada de reconhecimentos de responsabilidade por países, governos e instituições.
Sempre cobrando, à esquerda, a
fidelidade a seus compromissos históricos, acabou sendo acusada de ser a
responsável pela derrota de François Jospin nas presidenciais de 2002, mas se
tornou um dos braços fortes da campanha de Ségolèlene Royal na campanha de
2007. Foi nomeada ministra da justiça de François Hollande – ou melhor, Garde des Sceaux, como esse
cargo é tratado na linguagem quotidiana – e acabou se tornando a melhor face do
seu governo. Foi a autora e a defensora do projeto de lei do casamento
homosexual (ou, como ela mesma colocou, provando sua capacidade de simpliciar
as coisas, o “casamento para todos”), que acabou se tornando a principal marca
do governo Hollande. Nessa batalha, houve momentos memoráveis na forma de
debates parlamentares, sempre marcados pela coragem e pelo bom humor.
O que a fez demitir-se foi o
confronto de longa duração com o atual primeiro ministro, Manuel Vals, provável
candidato socialista nas próximas eleições e que pode ser tudo, menos, de fato,
um socialista. A gota d’água é o debate em curso em torno da lei que prevê a
“perda de nacionalidade”, uma bizarrice ridícula que, inconcebivelmente, os
socialistas de Vals tentam aprovar no Congresso.
Ninguém com bom senso pode ser
favorável a uma lei que prevê a “perda de nacionalidade” e a coisa, com efeito,
soa ainda mais bizarra num governo que tem uma pessoa do porte de Christiane
Taubira como ministra “da justiça”.
Reproduzo alguns videos de
Taubira no parlamento, sempre com suas marcas: coragem, bom humor, ironia, empatia:
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