Vivemos uma época de significados saturados. Isso se dá, em
grande parte, porque a cobertura da mídia (e,
igualmente, a “cobertura” da sociedade midiatizada nas suas redes sociais)
tende ao tautismo – ou seja, à versão impressionista, hiper-realista,
sentimentalista e anti-objetivista dos fatos.
Tautismo é um termo criado pelo teórico da comunicação Lucien Sfez a
partir da fusão da palavra tautologia (a “prova” de um fato por meio da
repetição sistemática de que ele realmente ocorreu, tão usual na mídia) com a
palavra autismo, compreendido por Sfez como uma experiência de isolamento
comunicacional. Tautismo, em síntese, é o autismo midiático, o autismo de
pessoas não autistas, jogadas num mundo irracional por meio da tautologia.
A semana que termina foi plena de tautismo. Do incêndio do Museu
Nacional ao atentado contra Bolsonaro, o que mais se viu foi a construção de
narrativas tautistas, todas elas colocando a realidade em segundo plano.
Na Rede Globo, repórteres falavam de suas lembranças de infância no
Museu Nacional e se usava, a todo momento, cenas da novela “Novo Mundo”, para
referir que o prédio do Museu abrigara, no passado, a família real brasileira.
No episódio do atentado, grafismos eletrônicos reproduziam as entranhas
de Bolsonaro explicando o percurso pretensamente feito pela faca que o teria
alvejado. E isso sem falar na repetição atroz da cenas e na expressão de pânico
dissimulado dos jornalistas e comentaristas do evento, buscando induzir medo na
audiência.
O tautismo, esse autismo da sociedade midizatizada, equivale a um elogio
do simulacro – para usar o conceito do filósofo Jean Baudrillard. É a forma
tomada pela realidade numa sociedade na qual a réplica vale mais que o
original, na qual a vontade intempestiva de juízes vale mais a justiça e de que
a lei e na qual a hiper-notícia ou a falsa notícia – a fake news - valem mais
de que a objetividade e de que o compromisso com a verdade.
Outra coisa que equivale ao elogio do simulacro é o ódio bolsonarista.
E, juntamente com ele, as demais forma de ódio, mesmo que “moderadas” (sic),
que tanto marcam a sociedade brasileira atual, nessa sua experiência de
passagem de seu histórico proto-fascismo ao fascismo militante.
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