Pular para o conteúdo principal

Dinâmicas do ícone nas sociedades monoteistas (Teoria da imagem - aula 2 - especialização)

I
O tema da aula de hoje procura enlaçar três temáticas co-pertinentes: imagem, verdade e ilusão. Discutiremos essa relação por meio da questão do ícone. Partamos da idéia de que há duas grandes tradições, em nossa cultura, no trato com a imagem. Uma delas vê a imagem com um princípio da realidade e a outra a tem como uma ilusão.
A primeira tradição propõe que a experiência de ver pode ser superior à própria experiência da realidade. Essa tradição constrói idéias como “ver com os próprios olhos”, “ver com os olhos que a terra há de comer” e “ver para crer”. Essas expressões indicam uma valorização da imagem em relação à realidade.
A segunda tradição, por sua vez, sugere que as imagens não são confiáveis. É a tradição que advém da metafísica platônica e que diz que o mundo das coisas aparentes é um mundo de ilusões, que a mímesis, que significa reprodução da cópia, é um procedimento perigoso e enganador.
O que explica esse paradoxo? O que explica que, dentro de uma tradição, a imagem seja respeitada, seja vista como algo que pode revelar a verdade e até mesmo superar a verdade e que, dentro de outra tradição, a imagem seja denunciada?
O fato social que centraliza esse paradoxo é o fato de que as duas tradições persistem, simultaneamente, a sua trajetória na cultura humana. A primeira tradição corresponde à experiência pré-moderna, pré-metafísica e, de certa maneira, também, anti-metafísica. Essa tradição resulta de uma experiência sensível da vida, se conformando, muitas vezes, como uma sabedoria popular, como um saber escuso, muitas vezes secreto. A segunda tradição corresponde ao saber da modernidade, que é um saber fundamentalmente metafísico. Essa tradição é inaugurada por Platão, mas Platão não é, na verdade, o ponto de partida dessa tradição. Ele a codifica, a intelectualiza, a estende. Efetivamente, essa tradição remonta a uma sabedoria arcaica que, conduzida pelo platonismo em alguns casos, mas não em outros. Ela resulta, a nosso ver, das dinâmicas sociais que envolvem a religiosidade monoteísta.
Na imagem, uma alegoria islâmica do monoteísmo: Alah transmite o verbo a seu profeta. Trata-se, na verdade, de uma raríssima imagem de fundo religioso produzida pelo islã. Ela condensa o pensamento havido simultaneamente por essas três religiosidades - judaica, cristã e islâmica - que constituem o saber monoteísta que discutiremos na aula.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de...

O enfeudamento da UFPA

O processo eleitoral da UFPA apenas começou mas já conseguimos perceber como alguns vícios da vida política brasileira adentraram na academia. Um deles é uma derivação curiosa do velho estamentismo que, em outros níveis da vida nacional, produziu também o coronelismo: uma espécie de territorialização da Academia. Dizendo de outra maneira, um enfeudamento dos espaços. Por exemplo: “A faculdade ‘tal’ fechou com A!” “O núcleo ‘tal’ fechou com B!” “Nós, aqui, devemos seguir o professor ‘tal’, que está à frente das negociações…” Negociações… Feitas em nome dos interesses locais e em contraprestação dos interesses totais de algum candidato à reitoria. Há muito se sabe que há feudos acadêmicos na universidade pública e que aqui e ali há figuras rebarbativas empoleiradas em tronos sem magestade, dando ordens e se prestando a rituais de beija-mão. De vez em quando uma dessas figuras é deposta e o escândalo se faz. Mas não é disso que estou falando: falo menos do feudo e mais do enf...

UFPA: A estranha convocação do Conselho Universitário em dia de paralização

A Reitoria da UFPA marcou para hoje, dia de paralização nacional de servidores da educação superior, uma reunião do Consun – o Conselho Universitário, seu orgão decisório mais imporante – para discutir a questão fundamental do processo sucessório na Reitoria da instituição. Desde cedo os portões estavam fechados e só se podia entrar no campus a pé. Todas as aulas haviam sido suspensas. Além disso, passamos três dias sem água no campus do Guamá, com banheiros impestados e sem alimentação no restaurante universitário. Considerando a grave situação de violência experimentada (ainda maior, evidentemente, quando a universidade está vazia), expressão, dentre outros fatos, por três dias de arrastões consecutivos no terminal de ônibus do campus – ontem a noite com disparos de arma de fogo – e, ainda, numa situação caótica de higiene, desde que o contrato com a empresa privada que fazia a limpeza da instituição foi revisto, essa conjuntura portões fechados / falta de água / segurança , por s...