Pular para o conteúdo principal

A sexualidade e o supérfluo na cultura contemporânea 2

Ocorre que o tema do amor é tradicionalmente descrito como um mal – apesar de sua cantada simplicidade. Não chegaremos, metafísicos que somos, jamais, a Shakespeare, para quem o amor tem, sempre, um frescor juvenil de maneira alguma dramático – não obstante seu entorno se constituir, eventualmente, como uma situação problemática. Não chegaremos. Nossa metafísica decorre desse pensamento grego fundador, no qual o amor é um delírio, um tremor, um luxo. Dizendo de outra maneira, algo supérfluo. A receita do latino Lucrécio para curar os males do amor é bem conhecida: sangrar a úlcera amorosa, por dolorido que seja. Daí sua recomendação em procurar os cuidados de uma “Vênus vagabunda” para o fazer. Por tal entenda-se uma prostituto, é lógico. Ali, desde sempre, se encontrou o acosto do supérfluo na sua mais pura face. A máscara calçada pela prostituta é, toda ela, uma máscara supérflua, feita por atos, posturas, práticas, maquiagens e vestimentas que transpassam a normalidade humana. Ora, segundo Lucrécio, o ato sexual com a prostituta (leia-se, no mundo contemporâneo, com a amante casual ou com qualquer outra criatura que não seja aquela que recebe os melhores afetos do amador) é um ato dos mais razoáveis, porque retira do amante a circunstância da paixão, do desvairio, lançando-o de novo na normalidade da carne, que é, ela toda, o furor do presente, do real e, assim, do verdadeiro. Portanto, a verdade amorosa estaria nessa dimensão tangencial da carne, na fantasia da carne. No sangramente da úlcera amorosa. Na simetheia, que, em grego antigo, quer dizer “comércio amoroso”. A verdade da carne estaria no supérfluo da carne, que, paradoxalmente, consiste na carne propriamente dita, no corpo. Portanto, aprendemos, com os antigos gregos, que é preciso esquecer essas bobagens românticas que catalizaram a compreensão dezenoviana do ato amoroso. É preciso esquecê-las e superar, ao mesmo tempo, a crença platônica de que o amor é um privilégio dos espíritos elevados. A carne grita em todos os corpos, e não apenas de fome. O amor é um reflexo ejaculatório, necessariamente e o supérfluo amoroso é, necessaramente, um receptáculo gozoso.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Eleições para a reitoria da UFPA continuam muito mal

O Conselho Universitário (Consun) da UFPA foi repentinamente convocado, ontem, para uma reunião extraordinária que tem por objetivo discutir o processo eleitoral da sucessão do Prof. Carlos Maneschy na Reitoria. Todos sabemos que a razão disso é a renúncia do Reitor para disputar um cargo público – motivo legítimo, sem dúvida alguma, mas que lança a UFPA num momento de turbulência em ano que já está exaustivo em função dos semestres acumulados pela greve. Acho muito interessante quando a universidade fornece quadros para a política. Há experiências boas e más nesse sentido, mas de qualquer forma isso é muito importante e saudável. Penso, igualmente, que o Prof. Maneschy tem condições muito boas para realizar uma disputa de alto nível e, sendo eleito, ser um excelente prefeito ou parlamentar – não estou ainda bem informado a respeito de qual cargo pretende disputar. Não obstante, em minha compreensão, não é correto submeter a agenda da UFPA à agenda de um projeto específico. A de

Leilão de Belo Monte adiado

No Valor Econômico de hoje, Márcio Zimmermann, secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, informa que o leilão das obras de Belo Monte, inicialmente previsto para 21 de dezembro, será adiado para o começo de 2010. A razão seria a demora na licença prévia, conferida pelo Ibama. Belo monte vai gerar 11,2 mil megawatts (MW) e começa a funcionar, parcialmente, em 2014.

Ariano Suassuna e os computadores

“ Dizem que eu não gosto de computadores. Eu digo que eles é que não gostam de mim. Querem ver? Fui escrever meu nome completo: Ariano Vilar Suassuna. O computador tem uma espécie de sistema que rejeita as palavras quando acha que elas estão erradas e sugere o que, no entender dele, computador, seria o certo   Pois bem, quando escrevi Ariano, ele aceitou normalmente. Quando eu escrevi Vilar, ele rejeitou e sugeriu que fosse substituída por Vilão. E quando eu escrevi Suassuna, não sei se pela quantidade de “s”, o computador rejeitou e substituiu por “Assassino”. Então, vejam, não sou eu que não gosto de computadores, eles é que não gostam de mim. ”