Confesso que estava esperando o pronunciamento de Palocci, desde o começo da crise, para poder formar minha opinião a respeito. A demora só serviu para confirmar o que todo petista que trabalha com comunicação sabe muito bem: que a demora em vir à imprensa e esclarecer as questões em aberto, sobre qualquer assunto com configuração política, é sintomática: representa um nó de poder. Um nó apertado. Quem devia desatá-lo atua para apertá-lo ainda mais. Os interesses são evidentes: agregar outras forças a esse esforço, obter apoio. Outras forças acorrem, umas para desatar um pouco esse nó (mas não muito) e outras para reforçá-lo. É um processo sintomático, mas natural de um fluxo de poder que tem muitos centros. O problema é que o poder é um fenômeno cuja materialidade exige certa centralidade... Na ausência dela, esse jogo de apertar e afrouxar vai crescendo, até o momento em que se chega ao “gambito de Damas invertido e recusado”. É uma metáfora do xadrez... Significa o chamamento da peça mais importante, a rainha; o blefe de trocá-la com vistas a uma operação de neutralidade.
Não vou me aprofundar nisso, mas, para quem quiser seguir com as metáforas enxadrísticas, deve-se saber que essa jogada perigosa – só admissível por mentes que privilegiam o interesse setorial, ou seja, a inversão da ordem lógica do xadrez, que é construir, no centro do tabuleiro, a ordem do poder – deve-se lembrar que o objetivo desse tipo de gambito é, em geral, o de “flanquear” o bispo, uma operação que confere muito, muito poder, a essa peça sempre muito sinistra (mas sinistra no sentido latino, de esquerda, digamos...), deslocando o centro de pode do jogo para um espaço mais lateral.
Deixemos isso para lá e voltemos ao Palocci. Enfim o homem falou. E falou mal, como se sabe. Ao longo do fim de semana li os jornais, as revistas e os blogs e deu para perceber que a idéia geral é que ele falou mal. O fato político conseqüente – dado como certo, ontem, pelo sempre bem informado Ricardo Kotscho – é que Palocci sairá do governo. Não tendo como saber se isso é verdade, façamos nossas considerações a respeito.
Minha opinião é que isso se tornou necessário. Como muitos, eu esperei uma fala convincente e rica em esclarecimentos. Uma fala que não veio. Ao contrario, veio uma fala dissimulada, com um falso tom moral (“não tenho o direito de ferir meus clientes”) e um clima meio sacristão (“peço humildemente seu voto de confiança”.
Achei tudo fake, meio constrangedor, etc. Palocci parecia um santarrão de festa, um bufão de castelete.
A questão central do problema era e não deixou de ser: deve Palocci informar o nome das empresas a quem prestou consultoria?
E a resposta é: deve.
Mais importante do que o sigilo profissional e a preservação da integridade das empresas e do mercado é a preservação da integridade do governo e, a longo termo, do próprio Estado. O interesse público deve falar mais alto.
Daí, obviamente, surge a questão: e se, entre essas empresas, houver alguma que, de alguma forma, tem negócios com o Estado ou poderia se ter beneficiado de informações privilegiadas e/ou jogo de influência? O que fazer? Ora, demissão sumaria, abertura de processo. Nesse caso o governo precisará expurgar a banda podre. E continuar. O que não pode é pairar sombra de dúvida a respeito do Chefe da Casa Civil.
Como o jornalista Luiz Carlos Azenha disse em seu blog, não se trata de uma questão policial, mas ética e politica, pois não há provas de que Palocci tenha cometido um crime, ou enriquecido ilicitamente. O PT o percebe e é por isso que tenta “politizar” o assunto. A entrevista de sexta-feira caminha nesse sentido. Ocorre que o melhor a fazer, do ponto de vista da politica de longo prazo – leia-se, do futuro do governo Dilma, da governabilidade e da imagem pública do PT – é passar tudo a limpo. Isso sim que é politizar a questão. Doa a quem doer.
Eu considero Palocci uma figura importante para o governo e, obviamente, percebo os interesses em jogo, da oposição e de setores do mercado, em derrubá-lo. Gostaria que o governo não precisasse prescindir dele, mas a demora em falar, o nó interno de poder e a ausência dos esclarecimentos devidos acabaram paralizando o governo.
Dilma deveria aprender com essa crise a construir em torno de si uma centralidade política - tal como Lula o fez com perfeição, a partir de certo momento do primeiro mandato - e não mais permitir as "flanqueações" de bispos.
O rito da entrevista de Palocci não deu resultado. Nitidamente, não foi o suficiente para conter o movimento político em curso. O governo Dilma deveria deixar as águas correrem. Seria sábio fazê-lo.
Comentários
No caso Palocci, confesso que ele nunca me inspirou confiança.Quando soube de sua nomeação para a Casa Civil no governo Dilma, fiquei deverás chateada. Depois do caso Francenildo, não havia mais clima para um novo retorno do Palocci ao governo, hoje da Dilma.
Na minha modesta opinião no lugar da Presidenta, teria deixado o Franklin Martins no MINC, o Celso Amorim no mesmo cargo, o Marco Aurélio Garcia, por enquanto são os que estão na minha lembrança, rsrsr.. . Há um bom tempo que leio os Blogs do PHA, Azenha, Rodrigo Viana, Eduardo Guimarães, Nassif, Brizola Neto e por ai vai, por não acreditar mais na nossa imprensa escrita e televisionada. O que me deixou intrigada na nomeação da Senadora do Paraná é por ela ser esposa do Paulo Bernardo, e de acordo com alguns comentários que li pela blogosfera, é de que as denúncias contra o Palocci também receberam reforço de fogo amigo do próprio partido(PT) e que um desses era o PB. Procede, na sua visão??
Obrigado pela visita. Olha, sobre o fogo amigo, acho que procede. Tenho uma amiga na chefia de gabinete de um senador de um outro estado que não o Pará que me enviou um email comentando justamente isso, o fogo amigo pesado, nesse caso. Mas olha, essa prática do fogo amigo é comum na política. Infelizmente. A Dilma gosta muito do Paulo Bernardo. Eu acho ele bem interessante, mas acho que não está no lugar certo. Os conflitos dele com a Telebrás demonstram pouca resolutividade na questão na banda larga (o PNBL) e, por outro lado, parece que a Lei da Comunicação está parada. O ideal era que oi Franklin Martins fosse ministro das Comunicações. Não do MinC (Ministério da Cultura), como vc diz (acho que vc se confundiu). E em relação ao MinC, a propósito, bom, lá tb está muito mal a coisa, não é? Em relação ao Palocci, enfim, conbcordo com o que vc diz: depois do caso Francenildo ficava complicado ele retornar a um cargo de tanta exposição como a chefia da casa Civil. Bem complicado. Abrço e volte sempre.