Segue uma anotação sobre o ano passado. Uma retrospectiva atrasada de fatos banais e/ou banalizados...
O 2012 que acaba não tem explicação e nem
precisa. Para mim, ele foi um privilégio. Para o mundo-sem-mim, foi mais um ano
apenas, na inocência preguiçosa de todo calendário. Para o mundo-em-mim, foi um
ano que abasteceu minha estupefactação. Explico: sou um rapaz curioso e que
continua se espantando com as coisas do mundo, apesar da crescente experiência
de vida.
Minha retrospectiva é descontínua,
irregular e se atém aos detalhes.
Eu me lembro que foi comprovada a
existência – 40 anos depois da sua construção teórica – do bolson de Higgs, a
“partícula de Deus”, ponto fundamental da estrutura da matéria.
Eu me lembro que 2012 é o ano em que muitas
coisas que davam como certas a acontecer não aconteceram: Israel não atacou o Irã, Bashar al Assad não foi deposto
e a Grécia ainda integra a zona do euro.
Eu me lembro que descobri que existe um
certo Bad Sex In Fiction Awards, prêmio concedido, na Inglaterra, à pior
descrição literária de um ato sexual do ano. A vencedora de 2012 foi uma autora
chamada Nancy Huston e a frase que a torno célebre foi “meu sexo nadava na
alegria como um peixe na água”. Talvez não os seus leitores, não é?
Eu me lembro que um tribunal condenou a
empresa farmacêutica GlaxoSmithKline a pagar 197 mil euros a um homem que, ao
tomar um medicamento preventivo contra o Parkinson, adquiriu uma “repentina e incontrolável”
compulsão pelo jogo. 197 mil euros! Algo com o que retomar o caminho dos
cassinos!
Eu me lembro que Kevin Doe, um jovem de 15
anos de Serra Leoa, morador de uma longínqua vila sem energia elétrica, construiu
uma bateria à base de soda, metal e ácido com um gerador quebrado e um
estabilizador de tensão encontrado numa lata de lixo. Eu também me lembro que
ele foi convidado a estudar no MIT.
Eu me lembro que cientistas holandeses
comprovaram que chimpanzés são capazes de reconhecer outros através de
fotografias de seus traseiros.
Eu me lembro do que me pareceu ser o
xingamento do ano. De Bernadette Chirac a seu marido, Jacques Chirac,
ex-presidente da França: “Hoje em dia, tu não és nada além que o batimento de
asas de um inseto”. Nem precisa dizer que, depois que o marido saiu da
presidência, d. Bernadette resolveu abrir o verbo e dizer tudo o que não podia,
quando a carreira política dele estava em curso.
Eu me lembro que o quadro “O Grito”, de
Edward Munch, foi vendido por 119,9 milhões de dólares, tornando-se a obra de
arte mais cara vendida num leilão.
E por falar nisso, eu também me lembro que,
num outro leilão, um manuscrito simplesmente ditado por Napoleão Bonaparte –
simplesmente ditado, repito – foi vendido por 375 mil euros!
Eu me lembro de ler Rimbaud com meu filho: “Ô saisons, ô châteaux, / Quelle âme est
sans défauts?”
Eu me lembro que foram descobertos dois
“vampiros” na Bulgária: os dois esqueletos encontrados, datados da Idade Média,
estavam presos com pedaços de ferro para lhes impedir de irem beber sangue
alheio nas madrugadas búlgaras.
Eu me lembro que sete mausoléus de 3 mil
anos, classificados pela Unesco como patrimônio cultural da humanidade, foram
destruídos, em Tumbuctu, no Mali, por islamistas radicais.
Eu me lembro que morreu Georges, a última
tartaruga gigante de sua espécie, aos 140 anos, nas Ilhas Galápagos.
Eu me lembro que o Rei da Espanha foi fotografado
participando de um safari, na África, caçando elefantes e pagando por isso 37
mil euros – em plena crise econômica que vai aos poucos destruindo o seu país.
Eu me lembro que a Argentina implantou sua
Ley de Medios e também me lembro que o governo Dilma, inexplicavelmente, evita
falar do assunto.
Eu me lembro que foi descoberta uma galáxia
(a MAC So647-JD) velha de 13,3 bilhões de anos e que ela foi considerada a
galáxia mais antiga já encontrada, formada logo depois do Big Bang.
Eu também me lembro de um fato banal que
ilustra toda uma história e que me deixou pensativo durante dias: de que o
governo da Coréia do Norte reduziu de 1,45 para 1,42 m a altura mínima para
aceitação no serviço militar nacional. Isso se deve, obviamente, a uma diminuição
da altura média da sociedade norte-coreana - de onde deduz-se o efeito da fome
sobre milhões de pessoas, durante décadas, mantida por um governo absurdo.
Eu me lembro de uma cena que me pareceu
insólita: a rainha da Inglaterra contracenando com James Bond na abertura dos
Jogos Olímpicos de Londres, fazendo seu próprio papel.
Eu me lembro da praça Tahir, todos os dias,
na televisão.
Eu me lembro que o Supremo Tribunal
Federal, neste ano, se tornou uma espécie de Big Brother político e que deu sucessivos
e vergonhosos shows de arrogância, histrionismo e talvez demência.
Eu me lembro que Edmilson Rodrigues chegou
perto de retornar à prefeitura de Belém e que, infelizmente, perdeu as
eleições.
Eu me lembro que Duciomar Costa, o pior
prefeito que Belém já teve, conseguiu a proeza de paralisar a cidade com o seu
BRT, uma obra descabida e desonesta.
Eu me lembro da obsessão de Dilma por
construir Belo Monte, decisão incorreta e autoritária, que tanto me decepciona.
Eu me lembro do Valmir Bispo, que morreu
este ano e que tanta falta faz.
Eu me lembro de cada conversa que tive com
meu pai, este ano, quase todas gravadas, e nas quais ele me contou segredos e
histórias develadoras do seu tempo, numa Belém que já deixou de existir.
Eu me lembro que o Euro fez 10 anos (e eu
estava em Paris, quando ele nasceu); que a primeira mensagem por celular fez 20
anos; que Amandine, o primeiro “bebê” de proveta, fez 30 anos; que James Bond
fez 50 anos; que os Rolling Stones também fizeram 50 anos e que a Place des
Vosges fez 400 anos.
Eu me lembro do vento frio de Montreal em
meu rosto e dos odores de pão e de açúcar tostado que ele trazia.
E, então, eu também poderia me perguntar
sobre o que espero para 2013.
Bom, na categoria espero e vou continuar
esperando, eu desejava é que se encontrasse uma forma de dar contraceptivos
para as 222 milhões de mulheres (segundo estimação da Unesco) que não têm
acesso a eles, nos países pobres. É só um desejo dentre muitos.
Na categoria espero que não aconteça, eu
quero é que o ex-prefeito de Belém não volte nunca a ocupar um cargo público e
que não deixe de prestar contas de seus erros. Aliás espero que ele seja
devorado pela justiça se ainda justiça houver.
No campo pessoal, desejo trabalhar muito,
ler alucinadamente, escrever como um louco, encontrar soluções para os
problemas que estão na minha gaveta, descobrir o mecanismo que está emperrando
a Roda de Java de rodar.
Também quero minha quota de preguiça, para
fazer inutilezas. Acatar o mundo, vê-lo. E, modestamente, abastecer seu
mistério.
Comentários