As eleições regionais francesas, que tiveram seu segundo turno ontem, à
parte terem demonstrado um expressivo crescimento dos votos na ultra-direita, o
Front National (FN), também demonstraram a capacidade das forças políticas locais
se unirem, numa situação de risco, para combater esse grande mal.
O FN é o grande mal. É um partido facista, com posturas radicais e
proposições racistas, mas que dissimula sua identidade por meio de uma máquina de
comunicação. Como disse o jornal Le Monde, o mais importante do país, no dia
seguinte ao primeiro turno, em seu editorial de capa, o Front National é “uma
grande impostura”.
Eu estava em Paris no domingo retrasado, quando ocorreu o primeiro turno
dessas eleições. Na França o 2o turno ocorre 7 dias apos o 1o
turno. Vi o avanço do FN, que venceu o 1o turno em 6 das 13 regiões
em disputa. Mas vi também, imediatamente, a mobilização dos agentes políticos
para barrar esse avanço. Na região do Pas-de-Calais-Picardie, por exemplo, onde
a candidata favorita era a própria presidenta do FN, Marine Le Pen (com 40,3%
dos votos do 1o turno) o candidato socialista, que ficou em terceiro
lugar, imediatamente abandonou a disputa pedindo que seus eleitores votassem no
candidato da direita, para barrar a vitória da ultra-dirteita. Na França, com
excessão das eleições presidenciais, 3 candidatos podem ir ao 2o turno.
Resultado: o candidato da direita recebeu 57% dos votos e Marine Le Pen recebeu
42%.
Esquerda, direita e ultra-direita
É preciso contextualizar. Na França, o que se chama “direita” é uma
direita em geral republicana. Com seus patifes e canalhas, é claro – como o
ex-presidente Sarkozy, por exempo – mas também com alguns nomes dignos, que defendem
causas nobres, inclusive "de esquerda". É uma direita que não receia se dizer direita. A “esquerda”, por
sua vez, possui um espectro mais variado: os socialistas possuem um programa
atualmente moderado, mas com grandes compromissos sociais; e há vários outros
partidos, mais radicais.
Já o FN é execrável, inadimissível, do ponto de vista de quem pensa na
política como diálogo. Razão pela qual todos se unem contra ele, em caso de
risco imediato.
Porém, o FN cresce. Eu morava na França em 2002 quando ele surpreendeu a
todos e foi para o 2o turno contra Jacques Chirac (que venceu),
deixando para trás o candidato socialista Lionel Jospin. Vi o grande choque que
isso provocou e fui para a Bastilha, com uns 2 milhões de pessoas, para
protestar contra o FN.
De lá para cá o FN cresceu. Teve 17% dos votos nas últimas
presidenciais. Fez mais deputados, se tornou uma presença constante na imprensa e passou a ser evocado nos debates públicos.
Por que o FN cresce tanto?
Um crescimento que não é sem razão. Numa sociedade em que a política é
marcada pela ambivalência e por uma forte tendência de conversão ao centro –
como é o caso de quase todo o Ocidente – direita e esquerda passam a medir
excessivamente as palavras e evitam propostas claras e diretas em relação a
grandes questões que incomodam o homem comum – como as questões da imigração,
da identidade, da reserva de emprego, do policiamento e da punição de menores,
por exemplo.
Já o FN se posiciona em relação a isso com muita clareza. E isso, associado
a uma capacidade midiática pautada por messianismos e por mensagens icônicas de
apelo direto (a Marselhesa, a bandeira francesa, Joana d’Arc, etc) acaba
soando, para imensa parte do eleitorado, como sinceridade, verdade,
coerência...
Por isso seu crescimento.
Comparando o FN com a direita brasileira
O FN é como a direita brasileira. A direita brasileira não é
republicana, como a direita francesa. Ela evita dizer seu nome. Ela se
dissimula no espectro político, tal como o FN.
Ela também evita debates e procura se apegar a essas questões simplórias
que preocupam o homem comum e cujo maior efeito é produzir falsos problemas.
Além disso, ela ainda se apóia em ícones messiâncos de facílima assimilação. O
FN, tal como a direita brasileira, vive de chavões, explorando a ignorância
política.
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