A taxa de mortalidade por Covid 19, na Alemanha, apresenta dados interessantes: 0,3%, contra 3,6% na França e 8?5% na Itália. Por que essa diferença? São três países europeus e vizinhos, economias desenvolvidas e estados com condições técnicas bem mais elevadas eu a grande maioria dos países do mundo. O que explica, então a diferença? O que explica a “exceção” alemã?
Venho lendo os jornais e os documentos públicos sobre o coronavirus desses países – quer dizer, não da Alemanha, porque não tenho alemão para isso – tentando entender a diferença. Atenção: não sou profissional da área da saúde, então o que anoto aqui são apenas dados de leitura e observações, e não considerações científicas.
E o que percebo são algumas variáveis interessantes: 1°) a média de idade das pessoas contagiadas é mais jovem na Alemanha de que em outros países: 47 anos na Alemanha; 2°) a decisão política imediata do estado alemão de testar, massivamente, a população – hoje num ritmo de 160 mil testes por semana; 3°) a superioridade do sistema hospitalar alemão em relação a seus dois vizinhos: 28 mil leitos de terapia intensiva, o que significa uma proporção de 6 leitos de UTI para cada 1.000 pessoas, contra médias de 3,1 da França e 2,6 da Itália; 4°) outra política imediata do governo alemão: encomendar a fabricação urgente de 10 mil novos aparelhos de respiração artificial, para somar aos 25 mil existentes no país – número, por sinal, bem superior aos dos outros países. Apenas a primeira dessas variáveis não resulta de uma política pública decisiva e eficiente.
Os resultados apresentados pela Alemanha são impressionantes, e deixam a impressão de que se devem à conjuntura de políticas públicas bem estruturadas com um nível de decisão política centralizado e operante, capaz de dar respostas ágeis numa situação de crise.
O que nos faz pensar no Brasil...
O que temos aqui? Um governo perdido, sem nenhuma centralidade, sem nenhuma condição técnica de governabilidade, não apenas incapaz de dar respostas mais simples para a situação como também dominado por uma tendência a produzir crises. Um governo inoperante.
O vídeo irresponsável de Bolsonaro tratando a cloroquina como uma droga salvadora para a pandemia e a sua recente decisão de ordenar ao exército que a produza massivamente é de uma imbecilidade sem igual na história. O mesmo personagem irresponsável não para de atacar governadores, defende a realização de jogos de futebol e de cultos evangélicos durante a pandemia e dá sinais públicos de ciúme da visibilidade de seu ministro da saúde. O mesmo personagem, inconsequente, ordena o corte de 158 mil famílias do programa Bolsa Família justamente no momento de mais necessidade dessas famílias, o elo mais frágil na defesa nacional contra a propagação do vírus.
Como disse Flávio Dino, governador do Maranhão, o presidente da república deveria parar de lutar contra os governadores e deveria lutar contra o coronavirus.
Como disse o jornalista Luís Nassif, o país está sem Estado Maior para gerenciar a situação e a tendência é que, por causa de Bolsonaro, perca a guerra contra o vírus.
Como disse Helder Barbalho, governador do Pará, traduzindo com precisão o estado de espírito dos governadores diante da inoperância de Bolsonaro: “Não vou ficar esperando que eles decidam o que vão fazer enquanto as coisas estão acontecendo. Preciso proteger o povo do Pará. A sociedade não pode ficar à mercê da falta de informação e de procedimento dos seus líderes.”
Como disse o educador Joan Edesson de Oliveira, “a pandemia, no Brasil, é agravada por outro vírus, o vírus do bolsonarismo”.
Como disse Fernando Haddad, “se a ciência não nos trouxer uma solução imediata, a política terá que nos entregar mais do que temos tido”.
Como disse Fernando Haddad, “se a ciência não nos trouxer uma solução imediata, a política terá que nos entregar mais do que temos tido”.
Bolsonaro não é apenas irresponsável. Também é um criminoso. A hecatombe italiana decorre, em grande parte, ao que vi acontecer – e eu estive na Itália no começo da onde de disseminação do vírus nesse país, em fevereiro – da falta de centralidade, da falta de informação e da falta de tomada de decisão.
Lá, como aqui, o governo federal entrou em luta com os governos regionais e municipais. Lá, como aqui – e ao contrário da Alemanha – não houve tomada de decisões estratégicas em relação às condições de saúde.
No Brasil de Bolsonaro, as decisões técnicas são tardias, insuficientes ou equivocadas. E é por isso que; na ausência do Estado nacional, estados federais e municípios vão tomando decisões, adotando medidas descoordenadas. Tal como ocorreu na Itália.
O que o governo Bolsonaro deveria fazer e não faz? 5 providências que deveriam ter sido tomadas e não foram:
1 – testes em massa.
2 – estabelecimento de critérios mais rigorosos de distanciamento social.
3 – ampliação de leitos de UTI e fabricação ou aquisição urgente de respiradores artificiais.
4 – recomposição do Mais Médicos.
5 – retomada do programa Revalida, de validação de diploma de médicos formados no exterior.
6 – regulação dos insumos necessários ao enfrentamento da pandemia – inclusive quanto ao comércio exterior.
7 – estabelecimento de políticas urgentes de apoio aos pessoal da área da saúde, facilitando suas condições de trabalho e isolamento social, inclusive com vistas a proteger suas famílias.
8 – estabelecimento de políticas de transferência de renda para as pessoas mais suscetíveis de contaminação (algo muito, muito além dos 200 reais cogitados pelo governo) – o projeto de Rena Mínima nacional do senador Eduardo Suplicy seria um modelo para isso.
8 – estabelecimento de políticas de transferência de renda para as pessoas mais suscetíveis de contaminação (algo muito, muito além dos 200 reais cogitados pelo governo) – o projeto de Rena Mínima nacional do senador Eduardo Suplicy seria um modelo para isso.
9 – revogação imediata da Emenda Constitucional 95/2016, feita por Michel Temer, que congelou os investimentos no SUS, retirando dele, até o presente, cerca de 22 bilhões de reais.
A décima medida seria afastar Bolsonaro do poder. Sua presença irresponsável como presidente, neste momento de crise gravíssima, produz morte, dor, desespero e conflito. Não precisamos disso no Brasil. Aliás, nunca precisamos, mas isso se torna evidente na conjuntura.
Demitir Bolsonaro é uma urgência de saúde pública e de Estado.
Fábio Fonseca de Castro
Professor da UFPA
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