A Covid acabou de levar, também, Valéry Giscard d’Estaing, presidente da França entre 1974 e 1981. A primeira história que escrevi na vida, creio que em 1976, aos 8 anos, narrava os diálogos entre um galo, chamado Pierre Cocovan, e ele. Infelizmente perdi o manuscrito... mas guardo de memória as gargalhadas de meu tio Arcelino Esperante, que a adorou – contra as expectativas de meu avô José, que esperava que eu escrevesse um conto de capa e espada e de meu pai, que desejava que eu escrevesse uma poesia de denso lirismo.
Mas voltemos a Giscard d’Estaing. Era um sujeito curioso: liberal e reformista, conservador mas pertencente a um tempo onde a direita ainda conseguia produzir gente responsável, comprometida com a melhoria da qualidade de vida da pessoas e com a justiça social.
Além disso, foi um internacionalista, um dos agentes centrais da construção da União Europeia. Oriundo da alta burguesia e da École Nationale d’Administration, o ENA, instituto francês de excelência na formação dos altos gestores públicos do país, foi o último suspiro dessa direita democrática, reformista e internacionalista antes do surgimento do neoliberalismo.
Cavalheiro gentil, com seus ares de nobreza, comprovou, antes de tudo, que a França nunca deixou de ser uma monarquia constitucional...
Mas recordo de uma das cenas mais insólitas que já na política. Ao concluir seu discurso televisionado de despedida do cargo, simplesmente levantou-se da frente das câmeras, colocou seu chapéu, saiu do palácio e entrou no metrô. Tudo isso às frentes das câmeras. Como tudo foi muito repentino e inesperado, soou como um tipo rude de proselitismo, mas... quem sabe.
Saindo da vida política, dedicou-se à escritura. Escreveu cinco romances e várias coletâneas de ensaios. Também produziu vários títulos de memórias, notadamente os três volumes de Le Pouvoir et la Vie, publicados entre 1988 e 2006. Acabou por tornar-se membro da Academia Francesa, lugar de grande prestígio em seu país.
Comentários