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Crônicas Canadenses 8: A volta da Trudeaumania


Crônica 8
A volta da Trudeaumania
Este domingo é dia de eleições para a liderança do Partido Liberal no Québec. Mas a grande disputa está se dando em torno da eleição nacional para a chefia dos Liberais. A convenção ocorre no próximo dia 14 de abril. No sistema político daqui, a eleição interna de um partido tem uma importância nacional, porque o líder tende a ocupar o cargo de Primeiro Ministro, caso o partido vença, proximamente, as eleições nacionais. Na minha forma de pensar, é como devia ser no Brasil e em todo lugar: o debate partidário, orgânico, ganha importância, envolvendo a sociedade: não apenas os afiliados a um partido – que são os que, efetivamente, votam nos seus líderes – mas toda a sociedade, já que, nesse sistema, bem mais importante que a pessoa é o partido.
O Partido Liberal do Canadá é o grande partido nacional, mas cada província tem sua própria conjuntura, inclusive com partidos provinciais que são mais fortes, localmente, que alguns partidos nacionais. Outra coisa, aliás, que considero muito positiva, dentro de um verdadeiro sistema federativo. É um partido de centro. Bem mais à direita do que eu votaria, mas bem menos à direita do que formulações bisonhas como o Republican Party americano ou o escatológico PSDB brasileiro.
O candidato que, certamente, vai ganhar é Justin Trudeau.
Muitos já ouviram falar no nome Trudeau, não é?
Seu pai foi Pierre Trudeau, antigo Primeiro Ministro canadense, do fim dos anos 1960 até 1984. Um mito. Um mito da política canadense, mas também, da sociedade canadense. E um mito, também, da comunicação política.
Pierre Trudeau foi eleito deputado federal em 1965, e em 1967 foi convocado para fazer parte da equipe de governo do Primeiro Ministro Pearson, ocupando a função de ministro da Justiça. Era o representante da província do Québec no governo federal. E se destacou, ganhou visibilidade, notoriedade. Com seu dinamismo, acabou representando a união nacional. Naquele tempo o Canada completava seu 100o aniversário de “independência”. As pessoas andavam procurando símbolos. A política norte-americana, como sempre, influenciava muito o país. Trudeau decidiu, nesse contexto, se candidatar à liderança do Partido Liberal.
Foi uma campanha apertada, mas aí, aconteceu um desses golpes do destino que fazem as coincidências parecerem brincadeiras de Deus: na véspera da convenção partidária, em 1968, Martin Luther King foi  assassinado. Trudeau reconstruiu toda a sua fala em torno dessa questão. Bradou a respeito da justiça social e do multiculturalismo. Tematizou o Canada como uma sociedade multicultural.
Uma espécie de Kennedy style. Só que mais radical: como havia namorado com o pensamento marxista, envolveu um espectro social bem mais largo que o alcançado pelo presidente americano. Eleito Primeiro Ministro, efetivamente, fez com que várias conquistas sociais avançassem no Canadá: o direito ao divórcio, os direitos homossexuais, a integração social dos imigrantes...
E logo começou a troudeaumania. Um dos eventos marcantes da história cultural contemporânea do Canada. É o apelido dado, em 1968, para excitação nacional e nacionalista gerada pela ação política de Pierre Trudeau.
As raízes da trudeaumania estão na experiência local da contracultura dos seventies. No fato de que Trudeau, além de jovem, tinha um espírito inconformado e, digamos assim, muita energia. Não parava quieto. Foi um dos políticos mais importantes do século XX. Pouco conhecido, é verdade, porque o Canada é um país recente, com uma população pequena, governado no âmbito de um sistema de dependência da Commonwealth que lhe introjeta o próprio espaço político.
Um momento alto da trudeaumania foi o casamento de Pierre Trudeau com Margaret Sinclair, filha de um tradicional político canadense, em 1971. Margaret, atriz e modelo, era considerada uma das mulheres bonitas do país. Teve com ela três filhos homens, um dos quais, o mais velho, Justin, é provável vencedor das eleições de domingo próximo.
Justin Pierre James Trudeau nasceu em 1971. Seu surgissement político ocorreu durante os funerais de seu pai, no ano 2000. Em 2008 foi eleito deputado federal pelo distrito de Papineau, localizado em Montreal, Québec. Tal como o pai, considera o nacionalismo quebécois “uma velha ideia do século XIX”, e com isso projeta um Canada multicultural.
Sua política tematiza a juventude, a diversidade e o meio-ambiente. Com esses temas, consegue se projetar em direção ao futuro. Eis aqui o site dele: http://justin.ca/. Conheçam-no. É uma aula de comunicação política. Especificamente porque consegue atualizar o ícone paterno num novo contexto. Nas tramas da cultura, é possível traduzir valores do passado em expectativas do presente. produzindo expectativas comoventes.
Numa disputa que começou acirrada, com sete candidatos, todos bem mais experientes e fortes que ele, conseguiu agregar apoio popular e político. Por um lado, renovando a troudeaumania. Por outro, inovando, comunicando com a juventude, renovando o Partido Liberal.
Pelas sondagens atuais, Trudeau já teria 75% dos votos partidários, muitos dos quais de novos afiliados ao PL, atraídos para a política pela sua ofensiva de comunicação. Os demais seis candidatos, todos lideranças mais experientes, acompanham atônitos sua ascensão.
Aos que se interessam por política, sugiro que prestem atenção em Justin Trudeau. Ainda é uma incógnita, mas seu começo é, no mínimo, curioso.

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